Roteiro de Aula

Estatais são realmente menos eficientes que a iniciativa privada?

Neoempreendedorismo estatal e novas técnicas societárias

1. CONHECENDO O BÁSICO

Depois de estudar os diversos papeis desempenhados pelo Estado na ordem econômica, identificamos um fenômeno minimamente curioso: a possibilidade de o Estado agir como um verdadeiro empresário, inclusive atuando em regime de concorrência no mercado privado. Este flanco de atuação do Estado abre toda sorte de questionamentos como, por exemplo, aquele que nomeia a presente aula: estatais são realmente menos eficientes que a iniciativa privada?

Como quase tudo que envolve o Estado, esta é mais uma daquelas perguntas que desperta grandes debates e discussões. Alguns podem pensar que o Estado empreendedor é menos eficiente que os particulares, partindo do pressuposto que investir em empresas públicas ou sociedades de economia mista pode ser um desperdício de dinheiro público. Por outro lado, alguns podem imaginar que um Estado mais eficiente e igualitário demanda a estatização de grandes empresas em setores estratégicos da economia para melhor distribuir os bens e serviços para a coletividade.

Mas, para responder essa pergunta, é preciso se questionar: por que as empresas existem? Juridicamente, a resposta mais simples pode ser baseada no princípio da autonomia patrimonial da sociedade empresária, blindando, em certa medida, o patrimônio de sócios e investidores. Embora seja um importante instrumento para o setor privado, a proteção patrimonial não aparenta ser suficiente, por si só, para justificar a atuação empresarial do Estado.

Nas ciências econômicas, algumas teorias buscaram identificar o papel e a influência da empresa (ali denominada de “firma”) nos mercados[1]. Mesmo tendo sido concebidas para empresas privadas – e, portando, sem levar em consideração aspectos como a existência de um interesse público que fundamenta a criação da empresa ou a própria participação do Estado como acionista –, as teorias econômicas da firma ajudam a compreender as razões que determinam a criação de uma unidade específica para atuação no mercado. No caso do particular, essa atuação visa a máxima rentabilização de seu capital. Para o Estado, por sua vez, o papel empreendedor está associado a alguma finalidade coletiva (“interesse público primário”), ainda que sem ignorar o interesse de obter lucro na operação (“interesse público secundário”). Ou seja, as métricas de análise nem sempre serão convergentes.

Compreendida a necessidade da empresa (ou da firma, para os economistas), retomamos a indagação inicial, isto é: as estatais realmente são menos eficientes do que as empresas privadas? O senso comum pode induzir uma resposta positiva, principalmente ao considerar que a presença do Estado atrai (ainda que parcialmente) algumas restrições do regime jurídico de Direito Público, como regras específicas para contratações. E, uma vez que limitações desta natureza não existem na esfera privada, presume-se que a liberdade empresarial permitiria uma maior eficiência negocial em favor dos particulares.

Embora essa constatação desconsidere diversas estratégias empresariais facultadas pela legislação ao Estado empreendedor (oportunidade de negócio, criação de subsidiárias, implementação de golden share), temos uma questão complexa que exige análise cuidadosa. Voltando para a firma estudada nas ciências econômicas, agora vamos centrar nossa análise em como as empresas se comportam e o que determina (ou limita) sua escala de atuação e seu crescimento. Para tanto, vamos nos aprofundar em três teorias.

A primeira é a conhecida teoria da agência. Alguns autores compreenderam que uma relação pode ser dividida em dois polos distintos: de um lado, encontra-se o principal, representando o contratante de determinada tarefa ou serviço; do outro lado, posiciona-se o agente, tido como o executor da função delegada, em benefício do principal. Cada um deles possui interesses próprios e distintos que, dentro de um cenário de maximização da utilidade individual (amplamente discutido na Economia), pode derivar conflitos dentro da relação, que apenas são mitigados por meio da assunção de custos pelo principal (custos de agência) para estabelecer mecanismos e incentivos capazes de evitar a conduta desviante por parte do agente

Essa teoria é plenamente aplicável para inúmeras situações (pense, por exemplo, na representação política), inclusive para dentro da firma, diante da divisão entre propriedade e gestão de uma empresa. Desta forma, decisões de gestão nem sempre observarão o interesse de maximização da rentabilidade dos investimentos realizados, especialmente em contextos nos quais inexistam mecanismos ou instrumentos (dentre eles, cita-se auditorias periódicas e remuneração variável do administrador com base na performance da companhia[2]) capazes de mitigar o risco de comportamento desviante como, por exemplo, em situações nas quais a implementação destes possui custo associado maior do que o próprio dano potencial sofrido pela companhia.

Além disso, podemos novamente recorrer à firma inovativa idealizada pela teoria da dependência de recursos. Para alcançar o máximo desempenho e dinamicidade exigida para a expansão e o crescimento da companhia, os recursos produtivos existentes (especialmente os recursos humanos) devem ser bem alocados a fim de permitir o desenvolvimento das capacitações necessárias para a distinção da firma em relação às demais. Este processo apenas é alcançado por meio da ação eficiente dos administradores, na condição de agentes responsáveis por delinear os rumos da firma, estabelecendo o ambiente mais favorável para sua expansão.

Por fim, situada no espaço de interseção entre as ciências econômicas e as ciências sociais, a teoria da coalização temporária introduz o fator político na análise da firma. Tendo como base os estudos de James March, as empresas são identificadas como sistemas de conflito, na medida em que cada indivíduo integrante deste processo (acionistas, administradores, funcionários, fornecedores, dentre outros) possui preferências específicas, sendo que, por sua própria natureza, torna-se materialmente impossível atender todas as demandas de forma simultânea, proporcionando o surgimento de conflitos. Por esta visão, mostra-se necessária a formação de coalizações que permitam estruturar e consolidar os processos internos (e externos) da firma, por meio de intensas negociações e mediações.

A eficiência da firma, portanto, é o resultado de inúmeras variáveis, sendo que elementos próprios do Direito Administrativo (regras de contratação e gestão, controle externo e social, dentro outros) não necessariamente constituem uma “âncora” que limita o crescimento e a expansão da empresa, podendo caracterizar elementos próprios que permitam uma gestão voltada a alcançar os resultados almejados, que nem sempre estarão voltados ao lucro (interesse público secundário), mas ao interesse coletivo que motivou a criação da estatal (interesse público primário).


[1] Dentre as Teorias, destaca-se a clássica contribuição de Ronald Coase, para quem a firma seria um arranjo jurídico dotado de capacidade para lidar de forma mais eficiente com os custos de transação, isto é, aqueles que integram o valor final do bem, mas não são incorridos em sua produção (e.g. busca e informação; barganha e decisão; implementação e monitoramento).  

[2] Ou, no caso de estatais, a presença de controle externo, representado pelos Tribunais de Contas.

2. CONECTANDO-SE COM A REALIDADE JURÍDICA E ADMINISTRATIVA

O Público e o Privado nas empresas públicas e sociedades de economia mista

O material selecionado para leitura busca mesclar aspectos teóricos e práticos do Direito Administrativo Societário e das técnicas à disposição do Estado para desempenhar o papel de empreendedor. Por se tratar de uma matéria com forte influência de aspectos públicos e privados, a coletânea designada busca, primeiro, situar o leitor sobre o regime jurídico aplicável, bem como possíveis intercorrências entre a multiplicidade de interesses envolvidos. Depois, em uma segunda etapa, são apresentadas as estratégias societárias de que dispõe o Estado para sua atuação.

Sendo o ponto de partida da leitura caracterizado pela compreensão acerca do regime jurídico aplicável às empresas públicas e sociedades de economia mista, nada melhor do que iniciar pelo próprio texto constitucional:

Art. 173 da Constituição de 1988

Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.

§ 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: (…)

II – a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários;

É importante esclarecer que, embora a Constituição Federal seja de 1988, o estatuto jurídico das empresas públicas e das sociedades de economia mista apenas foi editado em 2016. Esta inércia legislativa não representou a inexistência de controvérsias, que demandaram resposta de órgãos específicos, como o próprio Poder Judiciário. Muito pelo contrário. Um exemplo claro disso é extensão dos benefícios aplicáveis à Fazenda Pública (pagamento de dívidas pelo regime de precatórios) para as empresas públicas e sociedades de economia mista. Nesse ponto, dois julgados ilustram bem a situação e a solução construída:

STF, ADPF n.º 46

Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ Acórdão Min. Eros Grau,
Tribunal Pleno; j. 05.08.200, DJ 26.02.2010

(…)
1. O serviço postal — conjunto de atividades que torna possível o envio de correspondência, ou objeto postal, de um remetente para endereço final e determinado — não consubstancia atividade econômica em sentido estrito. Serviço postal é serviço público.
2. A atividade econômica em sentido amplo é gênero que compreende duas espécies, o serviço público e a atividade econômica em sentido estrito. Monopólio é de atividade econômica em sentido estrito, empreendida por agentes econômicos privados. A exclusividade da prestação dos serviços públicos é expressão de uma situação de privilégio. Monopólio e privilégio são distintos entre si; não se os deve confundir no âmbito da linguagem jurídica, qual ocorre no vocabulário vulgar.
3. A Constituição do Brasil confere à União, em caráter exclusivo, a exploração do serviço postal e o correio aéreo nacional [artigo 20, inciso X].
4. O serviço postal é prestado pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT, empresa pública, entidade da Administração Indireta da União, criada pelo decreto-lei n. 509, de 10 de março de 1.969.
5. É imprescindível distinguirmos o regime de privilégio, que diz com a prestação dos serviços públicos, do regime de monopólio sob o qual, algumas vezes, a exploração de atividade econômica em sentido estrito é empreendida pelo Estado.
6. A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos deve atuar em regime de exclusividade na prestação dos serviços que lhe incumbem em situação de privilégio, o privilégio postal.
7. Os regimes jurídicos sob os quais em regra são prestados os serviços públicos importam em que essa atividade seja desenvolvida sob privilégio, inclusive, em regra, o da exclusividade.
8. Argüição de descumprimento de preceito fundamental julgada improcedente por maioria. O Tribunal deu interpretação conforme à Constituição ao artigo 42 da Lei n. 6.538 para restringir a sua aplicação às atividades postais descritas no artigo 9º desse ato normativo.

STF, RE 599628

Rel. Min. Ayres Britto, Rel. p/ Acórdão Min. Joaquim Barbosa
Tribunal Pleno, j. 25.05.2011, DJ 17.10.2011

FINANCEIRO. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. PAGAMENTO DE VALORES POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL. INAPLICABILIDADE DO REGIME DE PRECATÓRIO. ART. 100 DA CONSTITUIÇÃO. CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA CONSTITUCIONAL CUJA REPERCUSSÃO GERAL FOI RECONHECIDA. Os privilégios da Fazenda Pública são inextensíveis às sociedades de economia mista que executam atividades em regime de concorrência ou que tenham como objetivo distribuir lucros aos seus acionistas. Portanto, a empresa Centrais Elétricas do Norte do Brasil S.A. – Eletronorte não pode se beneficiar do sistema de pagamento por precatório de dívidas decorrentes de decisões judiciais (art. 100 da Constituição). Recurso extraordinário ao qual se nega provimento.

Mesmo após a edição da Lei Federal nº 13.303/2016, conhecida como o “Estatuto Jurídico das Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista”, o tema continuou sendo abordado pela literatura especializada:

Direito Administrativo Societário – Uma Introdução

Por Alexandre Santos de Aragão
In: Revista de Direito da Procuradoria Geral, Rio de Janeiro, 71, 2017, pp. 509-524

O objeto deste artigo é demonstrar a existência de um sub-ramo do Direito, comum tanto ao Direito Administrativo, como ao Direito societário – o Direito Administrativo Societário, dando alguns exemplos de sua atípica aplicação.

Ele seria um híbrido presente sempre que o Estado atuasse na economia através de pessoas jurídicas empresariais. Seu objeto seria constituído, sobretudo, pelas empresas públicas e sociedades de economia mista. Abrangeria, porém, também as sociedades de propósito específico – SPEs controladas pelo Estado, expressamente colocadas sob o âmbito de incidência do Estatuto das Estatais (art. 1º, § 6º), e as participações minoritárias do Estado, inclusive as golden shares e acordos de acionistas por ele celebrados, gerando as chamadas empresas público-privadas, às quais já tivemos a oportunidade de dedicar trabalho específico.

As empresas estatais, como pessoas jurídicas de direito privado, revestem a forma de sociedades previstas no direito civil ou no direito comercial, sendo que as empresas públicas podem ser de qualquer uma de suas espécies e as sociedades de economia mista podem apenas ser sociedades anônimas.

O fato, no entanto, de revestirem essas formas típicas do direito privado não quer dizer que o regime jurídico correspondente lhe seja inteiramente e sem nuances aplicado, mesmo diante da paridade de regimes preconizada pelo art. 173 da CF para as estatais concorrenciais.

Fatores como a sua base legal específica, a necessidade de manutenção do controle societário pelo Estado para a não transmutação da sua própria natureza jurídica de estatal e peculiaridades do “melhor interesse da companhia” a cargo do acionista controlador, que, por força do art. 238 da Lei das S.A. c/c art. 4º, § 1º, do Estatuto das Estatais, inclui também preocupações de interesse público, faz com que o regime dessas empresas seja híbrido e atípico.

O que possui de direito societário não é, em sua maior parte, exatamente idêntico ao que é aplicável às empresas da iniciativa privada, e o que possui de Direito Administrativo por ser uma entidade da Administração Indireta, também sofre sérias alterações, sobretudo, se a estatal for independente do orçamento público e atuar em concorrência no mercado.

O Estatuto das Estatais veio aumentar esse hibridismo, contendo todo um regime societário próprio, apartado da Lei das S.A., em grande parte aplicável tanto às sociedades de economia mista, como às empresas públicas. Contém, por exemplo, normas específicas sobre acionista controlador e conselhos de administração e fiscal, requisitos e vedações para a designação de administradores. Especificamente em relação às empresas públicas, veda a emissão de debêntures e partes beneficiárias (art. 11).

Adicionalmente, o Estatuto das Estatais faz várias remissões à Lei das S.A., mas para determinar-lhe a aplicação não apenas às sociedades de economia mista, mas também às empresas públicas, revistam ou não a forma de sociedade anônima (ex.: art. 7º).

Possui na verdade todo um Capítulo – o Capítulo II do seu Título I – intitulado “Do Regime Societário da Empresa Pública e da Sociedade de Economia Mista”. A Lei das S.A. continua plenamente aplicável às sociedades de economia mista, salvo no que contrariar o Estatuto das Estatais; e agora é em parte também aplicável às empresas públicas, mas apenas no que o Estatuto das Estatais determinar a sua aplicação. Destarte, o Estatuto cria um regime híbrido para as estatais (já que cria regras à parte da Lei das SA), mas ao mesmo tempo concede um tratamento jurídico mais homogêneo com as sociedades empresárias privadas (aplicável, salvo exceções, às sociedades de economia mista e às empresas públicas, estendendo a estas inclusive alguns dispositivos da Lei das SA e das normas da CVM).

Como concluído em outras discussões havidas na Auloteca, identificamos que o interesse público nem sempre é o mesmo dos particulares. Para uma empresa com capital integralmente detido pelo Estado, o ponto pode não apresentar maiores desdobramentos. Vejamos o que diz a Lei Federal nº 6.404/1976 (“Lei das S/A”) e, sem seguida, uma notícia veiculando um caso concreto e decisão da CVM – órgão regulador do mercado de valores mobiliários no Brasil – que permitirão reflexões críticas sobre o ponto:

Lei Federal nº 6.404/1976 (“Lei das S/A”)

Art. 238. A pessoa jurídica que controla a companhia de economia mista tem os deveres e responsabilidades do acionista controlador (artigos 116 e 117), mas poderá orientar as atividades da companhia de modo a atender ao interesse público que justificou a sua criação.

Petrobras decide segurar repasses aos combustíveis apesar da alta do petróleo

Por Nicola Pamplona
Folha de São Paulo. 16 de setembro de 2019

A Petrobras decidiu esperar antes de decidir por reajustes nos preços da gasolina e do diesel. A avaliação na empresa é que o mercado ainda está muito volátil e que é preciso entender para onde vão as cotações internacionais, que subiram 13% nesta segunda (16).

Foi a maior alta diária desde o fim de 2008, em resposta a corte recorde na produção mundial após ataques a instalações petrolíferas na Arábia Saudita, que tirou do mercado uma capacidade equivalente a 5,7 milhões de barris por dia, ou 5% da oferta global.

Em nota divulgada no fim da noite, a estatal diz que segue monitorando o mercado internacional, mas optou por não fazer ajuste de forma imediata, já que “o mercado apresenta volatilidade e a reação súbita dos mercados ao evento ocorrido pode ser atenuada na medida em que maiores esclarecimentos sobre o impacto na produção mundial sejam conhecidos.”

A empresa ressalta ainda que não há periodicidade mínima em sua política de preços, que prevê acompanhar as cotações internacionais, com base em um conceito conhecido como paridade de importação — que simula quanto custaria para trazer combustíveis ao mercado interno.

A estatal vem fazendo ajustes em períodos mais estendidos do que durante o governo Michel Temer, quando as mudanças chegaram a ser diárias. Essa política gerou insatisfações que culminaram com a greve dos caminhoneiros, em maio de 2018.

A política de preços da companhia prevê acompanhar as cotações internacionais, com base em um conceito conhecido como paridade de importação — que simula quanto custaria para trazer combustíveis ao mercado interno.

Embora não haja prazos mínimos entre reajustes, a estatal vem fazendo ajustes em períodos mais estendidos do que durante o governo Michel Temer, quando as mudanças chegaram a ser diárias. Essa política gerou insatisfações que culminaram com a greve dos caminhoneiros, em maio de 2018.

O último reajuste no preço da gasolina foi anunciado no dia 5 de setembro. Já o preço do diesel subiu duas vezes este mês: no dia 5 e na sexta (13).

Para analistas, a crise atual é um teste para a autonomia da Petrobras em alterar os preços dos combustíveis, já questionada em outros momentos — em abril, o presidente Jair Bolsonaro determinou suspensão de aumento do óleo diesel alegando risco de greve dos caminhoneiros.

Em relatórios, analistas dos bancos UBS e Banco do Brasil Investimentos lembraram que fatores externos têm influenciado nas decisões da companhia e que novas intervenções podem prejudicar o processo de venda de refinarias. O controle de preços, dizem analistas, prejudica a competição e pode desvalorizar os ativos. O plano de negócios da Petrobras prevê a venda de oito de suas 13 refinarias.

Processo Administrativo Sancionador – CVM nº RJ 2013/6635

(…) 94. Não há nada que obrigue o Estado a prestar os serviços de transmissão e geração de energia elétrica por meio de uma sociedade anônima com acionistas privados. Pelo contrário: o poder público poderia confiar essas atividades a outro tipo de entidade integrante da Administração Pública, Direta ou Indireta (incluindo uma empresa pública), caso em que teria ampla liberdade para estabelecer as normas internas de governança da prestadora de serviços.

95. O recurso do poder público às sociedades anônimas pressupõe a adesão ao regime típico de sociedades anônimas privadas e abertas, com as exceções que constam do capítulo especial das sociedades de economia mista – e essas exceções, como já vimos, via de regra, fazem esse regime ainda mais rigoroso. Não há como escapar desse regime.

96. As normas da Lei nº 6.404, de 1976, invariavelmente limitam e condicionam a atuação do controlador, privado ou público. Em relação a este último, isso ocorre mesmo no que diz respeito à satisfação do interesse público que justificou a criação da companhia, tendo em vista o que diz a parte inicial do art. 238 ([a] pessoa jurídica que controla a companhia de economia mista tem os deveres e responsabilidades do acionista controlador) e o art. 235.

97. Em outras palavras, mesmo a persecução do interesse público que justificou a criação da companhia deve ser feita de acordo com as demais normas da lei, sobretudo aquelas que estabelecem uma proteção aos acionistas minoritários. O art. 238 só isenta o controlador de responsabilidade naquilo que a sua conduta tiver de satisfação do interesse público ali referido, mas não naquilo que, mesmo que simultaneamente, representar uma expropriação de valor dos minoritários ou o desrespeito às estruturas e proteções estabelecidas em lei.

98. A finalidade lucrativa, enquanto traço constitutivo das sociedades anônimas, é um exemplo de como as disposições da lei conformam a própria persecução desse interesse público.

99. Acredito que explorar um pouco esse exemplo seja útil no presente caso porque a Defesa transcreve um trecho extraído do livro do professor Mario Engler para, de um lado, corroborar seu entendimento de que o Estado não poderia se omitir diante de uma deliberação necessária à consecução do interesse público; e, de outro, apresentar o argumento de que quando o Estado exerce o poder de controle para assegurar a consecução do interesse público, ele não é responsável pelo impacto financeiro ou pelo custo implícito dessas políticas públicas.

100. Como já afirmado nesse voto, a CVM tem reconhecido que é legitimo ao Estado adotar uma conduta não maximizadora dos lucros – no entanto, isto não significa subverter a natureza lucrativa das sociedades por ações. Em outras palavras, embora o lucro em qualquer empreendimento empresarial seja sempre incerto, ele também não pode ser definitivamente suprimido pelo Estado, mesmo quando age ao amparo do art. 238 da Lei n° 6.404, de 1976. A finalidade lucrativa é um traço característico das sociedades anônimas e não faz sentido recorrer a essa forma societária se a intenção deliberada do poder público é manter a companhia atuando de forma sistematicamente deficitária e financeiramente insustentável.

101. A pessoa jurídica que controla uma sociedade de economia mista estaria violando a Lei nº 6.404, de 1976, se, ainda que a pretexto de satisfazer o interesse público que justificou a criação da companhia, desprezasse deliberadamente sua natureza lucrativa.

102. Nesse sentido, o mesmo autor citado pela Defesa (Mario Engler) afirma que “[o] exercício qualificado do poder de controle acionário não pode chegar ao ponto de subverter o tipo societário e violar o direito essencial de participar dos lucros sociais (cf. art. 109 da Lei nº 6.404/76)”. O autor também aponta que “a ausência reiterada de apuração de lucros e pagamento de dividendos pela companhia pode constituir motivo para os acionistas minoritários requererem a dissolução judicial, por impossibilidade de cumprimento de seu fim”, de acordo com o art. 206, inciso II, alínea “b”, da Lei n° 6.404, de 197628-29.

103. Talvez o interesse público que justificou a criação da companhia fosse melhor atendido se o poder público pudesse descuidar da finalidade lucrativa da sociedade e eventualmente alocar todos os excedentes na melhora do serviço público que ela presta. Da mesma forma, sem se preocupar com a geração de excedentes, o poder público poderia cobrar dos consumidores tarifas ainda menores, que bastassem para manter a economicidade da prestação do serviço – isto é, a sua mera sustentabilidade do ponto de vista econômico. O Estado sempre poderá fazê-lo e de forma legítima, por meio de algumas das formas que pode adotar para prestar os serviços públicos de sua incumbência. No entanto, ao recorrer às sociedades anônimas, em especial, sob a forma aberta, a observância do regime da Lei nº 6.404, de 1976, se impõe e essa liberdade sofre restrições.

104. Assim como o interesse público que justificou a criação da sociedade não equivale a uma carta branca para desprezar a natureza lucrativa das companhias, ele tampouco autoriza a pessoa jurídica de direito público que controla uma sociedade de economia mista a ignorar outras normas que igualmente constam da Lei nº 6.404, de 1976. 105. Em uma sociedade de economia mista com acionistas privados, as salvaguardas da Lei nº 6.404, de 1976, não devem ser vistas como óbices à concretização do interesse público que justificou a criação da companhia, mas como balizas que limitam, condicionam e dão forma à própria satisfação desse interesse. São regras do jogo, a que o Estado aderiu e se submeteu espontânea e livremente quando confiou às companhias a realização de finalidades públicas.

Os trechos destacados acima não têm por pretensão esgotar a matéria, mas apresentar um quadro acerca da forma como a contraposição entre interesse público e privado é abordada quando o foco são as empresas públicas e as sociedades de economia mista. Um bom exercício para aprofundar o tema é buscar compreender a diferença entre o controle de preços da Petrobras e a renovação das concessões de distribuição e transmissão de energia elétrica que motivam o PAS CVM nº RJ2013/6635.

Estratégias Societárias: quais são elas?

Iniciando a segunda parte desta discussão, nada melhor do que apresentar uma inovação legislativa trazida pela Lei Federal nº 13.303/2016. Trata-se de uma forma distinta de contratação prevista exclusivamente para empresas públicas e sociedades de economia mista. Vejamos, também, a interpretação desse arranjo pelo Conselho da Justiça Federal:

Art. 28 da Lei Federal n.º 13.303/2016

Art. 28. Os contratos com terceiros destinados à prestação de serviços às empresas públicas e às sociedades de economia mista, inclusive de engenharia e de publicidade, à aquisição e à locação de bens, à alienação de bens e ativos integrantes do respectivo patrimônio ou à execução de obras a serem integradas a esse patrimônio, bem como à implementação de ônus real sobre tais bens, serão precedidos de licitação nos termos desta Lei, ressalvadas as hipóteses previstas nos arts. 29 e 30. (…)

§ 3º São as empresas públicas e as sociedades de economia mista dispensadas da observância dos dispositivos deste Capítulo nas seguintes situações:

I – comercialização, prestação ou execução, de forma direta, pelas empresas mencionadas no caput, de produtos, serviços ou obras especificamente relacionados com seus respectivos objetos sociais;

II – nos casos em que a escolha do parceiro esteja associada a suas características particulares, vinculada a oportunidades de negócio definidas e específicas, justificada a inviabilidade de procedimento competitivo.§ 4º Consideram-se oportunidades de negócio a que se refere o inciso II do § 3º a formação e a extinção de parcerias e outras formas associativas, societárias ou contratuais, a aquisição e a alienação de participação em sociedades e outras formas associativas, societárias ou contratuais e as operações realizadas no âmbito do mercado de capitais, respeitada a regulação pelo respectivo órgão competente

Enunciado 27 da I Jornada de Direito Administrativo do
Conselho da Justiça Federal

A contratação para celebração de oportunidade de negócios, conforme prevista pelo art. 28, § 3º, II, e § 4º da Lei n. 13.303/2016 deverá ser avaliada de acordo com as práticas do setor de atuação da empresa estatal. A menção à inviabilidade de competição para concretização da oportunidade de negócios deve ser entendida como impossibilidade de comparação objetiva, no caso das propostas de parceria e de reestruturação societária e como desnecessidade de procedimento competitivo, quando a oportunidade puder ser ofertada a todos os interessados.

Por estarem, muitas vezes, inseridas em um mercado concorrencial, a oportunidade de negócio surge, então, como uma possibilidade legal de conferir maior flexibilidade de contratação às empresas estatais, fugindo dos modelos preestabelecidos de contratação direta ou procedimento licitatório. Todavia, pode-se dizer que a lei foi omissa (propositalmente?) no que diz respeito aos critérios para adoção desta modalidade, o que acabou ensejando – concretizando uma outra tendência do Direito brasileiro atual, que o Tribunal de Contas da União acabasse (exacerbando suas funções?) definindo os parâmetros exigidos para a formação desta espécie de vínculo:

Acórdão n.º 2.488/2018 – TCU

Rel. Min. Benjamin Zymler; Plenário; j. 31.10.2018

São requisitos para a contratação direta de empresa parceira com fundamento no art. 28, § 3º, inciso II, da Lei 13.303/2016 (Lei das Estatais):
a) avença obrigatoriamente relacionada com o desempenho de atribuições inerentes aos respectivos objetos sociais das empresas envolvidas;
b) configuração de oportunidade de negócio, o qual pode ser estabelecido por meio dos mais variados modelos associativos, societários ou contratuais, nos moldes do art. 28, § 4º, da Lei das Estatais;
c) demonstração da vantagem comercial para a estatal;
d) comprovação, pelo administrador público, de que o parceiro escolhido apresenta condições que demonstram sua superioridade em relação às demais empresas que atuam naquele mercado; e e) demonstração da inviabilidade de procedimento competitivo, servindo a esse propósito, por exemplo, a pertinência e a compatibilidade de projetos de longo prazo, a comunhão de filosofias empresariais, a complementariedade das necessidades e a ausência de interesses conflitantes

Um ponto interessante é a seleção do parceiro privado por inviabilidade de procedimento competitivo. A aparente permissão de contratação com base em critérios subjetivos do particular em detrimento de critérios objetivos (menor preço, maior desconto, dentre outros) é uma grande inovação no âmbito da Administração Pública, permitindo um modelo mais dialógico e negocial assemelhado ao setor privado, mesmo que precedido de procedimento impessoal. Indicamos a leitura:

Enunciado 30 da I Jornada de Direito Administrativo do
Conselho da Justiça Federal

A “inviabilidade de procedimento competitivo” prevista no art. 28, § 3º, inc. II, da Lei 13.303/2016 não significa que, para a configuração de uma oportunidade de negócio, somente poderá haver apenas um interessado em estabelecer uma parceria com a empresa estatal. É possível que, mesmo diante de mais de um interessado, esteja configurada a inviabilidade de procedimento competitivo.

Licitação – que, mesmo à moda das estatais, é pautada por critérios bastante objetivos, quase matemáticos, que procuram neutralizar a persona do agente público – não é o método mais adequado para realizar esse tipo de seleção.

Em contratações que envolvam oportunidade de negócio – isto é, parceria com privado, por vezes de longo prazo, para a consecução de finalidade empresarial comum – a realização de procedimento do tipo licitatório pode colocar o ente público numa cilada. […]

A celebração de parcerias atinentes a oportunidades de negócios pressupõe seleção que dê ao contratante abertura para uma avaliação que vá além da formal quanto às características, tangíveis e intangíveis, do privado, em especial sua confiabilidade e independência, e quanto aos elementos técnicos em jogo[1].

Uma das questões relacionados ao art. 28, § 3º, II, está na forma de escolha do sujeito privado. Sempre que isso se mostrar possível e adequado para o objeto do contrato, caberá à empresa estatal realizar um processo competitivo. Este processo não será uma licitação pública da LEE e será definida pela empresa estatal. Esse processo seletivo pode envolver negociações com diferentes parceiros, em que diferentes elementos podem ser trazidos por cada um. Isso significa que, mesmo aqui, nem sempre será possível ter ‘critérios objetivos de julgado’, pois pode ser necessário que, para chegar na melhor oportunidade de negócio, a empresa estatal tenha que ponderar diversos elementos, alguns deles intangíveis (ex.: posicionamento da marca)[2].

Outra estratégia societária consiste na criação de subsidiárias. Para tanto, o Estado, por meio da empresa pública ou sociedade de economia mista inicial, passa a gerenciar outra companhia. Esta segunda estatal passa a deter domínio do capital votante de uma terceira empresa, esta sim, caracterizada como subsidiária. A Lei Federal nº 13.303/2016 assim dispõe e o TCU já enfrentou o tema:

Art. 2º da Lei Federal nº 13.303/2016

Art. 2º A exploração de atividade econômica pelo Estado será exercida por meio de empresa pública, de sociedade de economia mista e de suas subsidiárias.

§ 2º Depende de autorização legislativa a criação de subsidiárias de empresa pública e de sociedade de economia mista, assim como a participação de qualquer delas em empresa privada, cujo objeto social deve estar relacionado ao da investidora, nos termos do inciso XX do art. 37 da Constituição Federal.

Acórdão n.º 2.706/2022 – TCU

Rel. Min. Bruno Dantas; Plenário; j. 07.02.2022

(…)
50. Entendo arriscado afirmar categoricamente que a configuração do caráter privado da empresa resultante da parceria com a estatal seja única e exclusivamente o limite de 50% menos uma ação com direito a voto, como pretende a Caixa. Se assim o fosse, no limite, estaríamos abertos à perspectiva irrestrita de verticalização das operações, cujo resultado seriam empresas privadas revestidas das prerrogativas típicas de companhia estatal, como o poder de indicação de cargos, o exercício real de controle e o usufruto de ativos públicos.

51. Todavia, ressalto que a decisão proposta neste Voto não tem a pretensão de se imiscuir na discricionariedade da gestão das estatais, sobretudo na motivação dos atos concernentes à tomada de decisão relativa à verticalização de suas operações. O que está em discussão, reitero, é a presença de poder de controle nas subsidiárias e joint ventures, bem como a submissão, ou não, aos ditames da Lei das Estatais.

52. Assim, razoável a conclusão da SecexFinanças de que o regime jurídico societário das subsidiárias das empresas estatais é o da Lei 6.404/1976, salvo as disposições expressas em sentido diverso na Constituição Federal e na Lei das Estatais. No caso específico das formas possíveis de controle, ante o silêncio dessa última, aplica-se o conceito de controle material da influência dominante (preponderância nas deliberações sociais e o poder de eleger a maioria dos administradores), previsto no art. 116 e no § 2º do art. 243 da Lei 6.404/1976, ainda que o controle acionário da estatal se origine de participação minoritária no capital social da companhia controlada.

53. Em diversas oportunidades, manifestei-me quanto ao entendimento pacífico neste Tribunal de que o Estado não pode se valer de técnicas societárias com a finalidade de burlar o regime constitucional aplicável às empresas estatais, a exemplo do Acórdão 1220/2016-TCU-Plenário (será abordado adiante) – que cuidou da análise da legalidade e da legitimidade de aquisição de participação acionária por parte de subsidiária integral da Caixa Econômica Federal.

54. Defendi, em variadas ocasiões, especialmente no voto condutor da mencionada decisão, que o exercício pelo Estado do poder de controle numa empresa público-privada importa na sua caracterização como sociedade de economia mista de fato. Em outras palavras, as empresas privadas controladas materialmente pelo Estado, ou seja, aquelas em que o sócio estatal exerce a preponderância do poder de controle por meio de direitos que lhe asseguram o domínio nas deliberações sociais ou o poder de eleger a maioria dos administradores, funcionarão tais quais as empresas em que o Estado detenha a maioria do capital social com direito a voto.

55. Ou seja, tal reconhecimento vai exatamente ao encontro do que propõe a unidade instrutora: a figura do “acionista controlador” não está limitada ao agente que detém o controle formal traduzido pela maioria das ações com direito a voto, mas também inclui a pessoa ou o grupo de pessoas que possua o controle material de uma sociedade, como preceitua a Lei das S.A., aplicada às estatais segundo a disciplina do artigo 7º da Lei 13.303/2016.

56. Digo mais. Essa conclusão guarda consonância com o que restou decidido no julgamento do Acórdão 1344/2015-TCU-Plenário, quando esta Corte assentou, de forma contundente, que os fatos jurídicos efetivamente realizados no plano da existência é que devem servir de norte para a real aplicação da norma jurídica, não podendo ser afastados pelo mero uso formal de uma sutil engenharia jurídico-financeira, mormente quando entre as possíveis repercussões figura a de tentar afastar o exercício constitucional pelo TCU do controle externo sobre a administração da coisa pública.

57. Deixo claro que essa convicção não retira a prerrogativa daquelas empresas público-privadas em que o Estado não exerce a preponderância do poder de controle (ou seja, as empresas meramente “participadas”, não as “controladas ou subsidiárias”) de concorrer em posição de igualdade com as demais empresas do setor privado, ante a ameaça de afronta ao princípio da isonomia.

58. Dessa forma, é compreensível a real necessidade de discernir em que medida a formação de parceria estratégica e a relação da nova empresa formada com a estatal se encaixam nas situações do precedente acima mencionado. Com efeito, com vistas a analisar a existência de controle material, ou seja, identificar os reais controladores para fins de deveres e responsabilidades, deve-se avaliar as particularidades dos casos concretos e os seus respectivos acordos de acionistas e/ou estatutos sociais.

59. Isso porque o poder decorre de direitos. Para ter poder de controle sobre a nova empresa, o investidor (no caso a estatal) deve possuir direitos que lhe deem a capacidade atual de dirigir as atividades relevantes.

Ainda sob a ótica do art. 2º, § 2º, da Lei Federal nº 13.303/2016, também é facultada a participação de estatais em empresas privadas, na condição de acionista minoritário. Esta estratégia permite ao Estado agir tanto no fomento para o desenvolvimento de grandes empresas nacionais como na obtenção de know-how relevante, posteriormente revertido em prol de estatais ou até mesmo da Administração Pública Direta, senão vejamos:

O Estado acionista: empresas estatais e empresas privadas com participação estatal

Por Rafael Wallbach Schwind
Rio de Janeiro: Editora Almedina, 2017, p. 150-151

Podemos definir a categoria das empresas privadas com participação estatal como sendo as sociedades comerciais privadas, não integrantes da Administração Pública, em que o Estado, diretamente ou por meio de um ente estatal, participa como sócio e se vale de instrumentos societários destinados a direcionar o comportamento da empresa para a realização de determinados objetivos públicos previstos no ordenamento jurídico, mas sem possuir, de modo permanente, preponderância no exercício do poder de controle.

As empresas privadas com participação estatal derivam da constatação de que a intervenção do Estado no âmbito econômico para o atingimento dos objetivos previstos no caput do art. 173 da Constituição Federal não se restringe à atuação por meio de empresas estatais. […] nada impede que o Estado possa se valer de uma técnica acionária, ou seja, participe de empresas privadas como sócio com vistas a influenciar sua atuação. Nesse caso, aportará o seu apoio institucional e investirá recursos estatais, por entender que as atividades desempenhadas por essas empresas atenderão determinadas finalidades que justificam o comprometimento da Administração Pública com o negócio. Com isso, o Estado figurará como sócio da empresa e disporá de instrumentos que direcionem o comportamento desta, ainda que sem preponderância no controle interno da sociedade.

Entretanto, nestes casos, por figurar como acionista minoritário, o controle de fato da companhia será exercido pelos acionistas privados. Deste modo, há a possibilidade de que expedientes prejudiciais ao interesse público sejam verificados, visando a maximização de lucro para o setor privado:

Acórdão n.º 1.865/2016 – TCU

Rel. Min. Augusto Nardes; Plenário; j. 20.07.2016

(…)
7. Em decorrência do modelo de exploração da infraestrutura aeroportuária adotado para os cinco aeroportos já outorgados, alterações relevantes na atuação dos órgãos e entidades do setor foram e são necessárias. No caso da Infraero, ressalto mudanças significativas resultantes de sua participação no capital social das concessionárias, que constituem importante desafio à governança da estatal. Se por um lado a empresa passou a ter direito ao recebimento de dividendos e oportunidades de melhoria de gestão com o compartilhamento de experiências com os novos operadores aeroportuários, por outro, perdeu receitas advindas da exploração direta desses aeroportos e deve fazer ajustes em sua estrutura e forma de atuação, condizentes com sua condição de sócia de grandes empresas e com sua obrigação de zelar pela boa aplicação dos recursos públicos envolvidos.

8. A participação da Infraero nas concessões, por meio da criação de SPEs, foi fundamentada em três objetivos principais: i) assegurar o recebimento de dividendos em substituição às receitas até então auferidas com a operação desses aeroportos; ii) fortalecer a gestão da empresa estatal pela absorção das melhores práticas adotadas pelos agentes privados na ampliação, reforma e operação dos aeroportos; e iii) marcar o interesse público pela presença da União nesses aeroportos, identificados como estratégicos ou de especial relevância.

9. A empresa, como detentora de 49% do capital das concessionárias dos aeroportos analisados e maior acionista individual em todas as SPEs formadas, participa dos investimentos realizados no âmbito dos contratos de concessão.

10. O maior risco identificado na inserção da Infraero como sócia relevante das concessionárias é a possibilidade de haver interesses dos acionistas de realizar com suas partes relacionadas contratações cujos valores e condições não corresponderiam àqueles usualmente praticados no mercado, com o emprego de recursos federais por meio de aportes da Infraero acima do necessário, visando a beneficiar a parte relacionada em detrimento dos direitos da empresa estatal e do erário.

Por fim, existem situações nas quais o Estado pode entender justificada a necessidade de extinguir a empresa estatal por meio da alienação de suas ações ao mercado privado, mediante o processo de desestatização, popularmente conhecido como privatização. Para tanto, é necessária a obtenção de autorização legislativa prévia, que pode se dar, inclusive em termos genéricos, como já decidiu o STF:

STF, ADI 6241

Rel. Min. Carmen Lúcia; Tribunal Pleno, j. 08.02.2021, DJ 22.03.2021

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. REQUERIMENTO DE MEDIDA CAUTELAR. LEIS FEDERAIS NS. 9.491/1997 E 13.334/2016. DESESTATIZAÇÃO DE EMPRESAS PÚBLICAS E SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA. IMPUGNAÇÃO GENÉRICA. CONHECIMENTO PARCIAL DA AÇÃO. CONSTITUCIONALIDADE DA AUTORIZAÇÃO LEGAL GENÉRICA PARA A DESESTATIZAÇÃO DE EMPRESAS ESTATAIS. AÇÃO PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESSA PARTE, JULGADA IMPROCEDENTE. 1. Não se conhece da ação direta de inconstitucionalidade na qual a impugnação às normas é apresentada de forma genérica. Precedentes. 2. Para a desestatização de empresa estatal é suficiente a autorização prevista em lei que veicule programa de desestatização. Precedentes. 4. Autorização legislativa genérica é pautada em princípios e objetivos que devem ser observados nas diversas fases deliberativas do processo de desestatização. A atuação do Chefe do Poder Executivo vincula-se aos limites e condicionantes legais previstos. 5. Ação direta parcialmente conhecida quanto à impugnação da autorização de inclusão de empresas estatais no plano de desestatização prevista no caput do art. 2º e no § 1º do inc. I do art. 6º da Lei n. 9.491/1997 e, nessa parte, julgado improcedente o pedido.

Mesmo reconhecendo a possibilidade de alienar parte da sua participação em determinada empresa, com a consequente perda do controle acionário, o Estado pode identificar a necessidade de garantir poderes e prerrogativas especiais para manter certo grau de gerenciamento de sua atuação futura. Este instrumento caracteriza a denominada golden share, ação de classe especial que confere ao acionista minoritário poder de exercer determinadas modalidades de controle intrassocietário que não correspondem ao percentual de participação que detém:

Art. 8º da Lei Federal n.º 9.491/97

Art. 8º Sempre que houver razões que justifiquem, a União deterá, direta ou indiretamente, ação de classe especial do capital social da empresa ou instituição financeira objeto da desestatização, que lhe confira poderes especiais em determinadas matérias, as quais deverão ser caracterizadas nos seus estatutos sociais.

Art. 17, §7º, da Lei Federal n.º 6.404/76

Art. 17, § 7º. Nas companhias objeto de desestatização poderá ser criada ação preferencial de classe especial, de propriedade exclusiva do ente desestatizante, à qual o estatuto social poderá conferir os poderes que especificar, inclusive o poder de veto às deliberações da assembléia-geral nas matérias que especificar.

O Estado acionista: empresas estatais e empresas privadas com participação estatal

Por Rafael Wallbach Schwind
Rio de Janeiro: Editora Almedina, 2017, p. 378

Por meio da detenção de golden shares pelo Estado nas companhias privatizadas, o poder público, ao mesmo tempo em que permitia a assunção do controle pela iniciativa privada, com a consequente desoneração dos cofres públicos, teria prerrogativas específicas no interior das companhias como forma de resguardar os interesses estratégicos do Estado nas atividades, mas sempre sem prejudicar o funcionamento da empresa.

O mecanismo da golden share garante poderes como o direito de nomear membros para órgãos de direção ou mesmo poder de veto para determinadas deliberações como, por exemplo, alteração de nome, objeto social, dissolução, dentre outros. Sua inclusão em processos de desestatização pode representar um relevante instrumento para permitir que o interesse público que motivou a criação da empresa pública ou da sociedade de economia mista seja mantido mesmo após sua desestatização.

Nesse sentido, vale conferir trecho relativo à inclusão de golden share na exposição de motivos do Projeto de Lei nº 1.501/2023 e o texto final da Lei nº 17.853/2023 do Estado de São Paulo, que culminou na recente privatização da SABESP:

Exposição de motivos do Projeto de Lei nº 1.501/2023

O artigo 3º, por seu turno, contempla determinadas prerrogativas que o Estado de São Paulo, na condição de acionista, deterá em relação à SABESP após o processo de desestatização. Esse ar go es pula que o Estado será titular de uma ação preferencial de natureza especial, comumente designada como “golden share“. Tal instrumento, amparado pelo §7º do ar go 17 da Lei das Sociedades por Ações (Lei Federal nº 6.404/1976), confere ao Estado o poder discricionário de vetar decisões da companhia que possam divergir dos propósitos estabelecidos para a desestatização. Em particular, decisões que afetem diretamente as atividades fundamentais da companhia, a prestação de serviços de abastecimento de água e de esgotamento sanitário, ou que modifiquem os limites de direito de voto dos acionistas ou grupo de acionistas. Adicionalmente, é assegurado pelo mencionado ar go a permanência da sede da SABESP na capital paulista e a preservação de sua nomenclatura atual. No tocante aos parágrafos 1º e 2º desse ar go, fica estabelecido que competirá ao Conselho Diretor do Programa Estadual de Desestatização (CDPED) determinar o limite máximo de direito de voto aplicável a acionistas ou conjuntos de acionistas independentemente do número de ações ordinárias, assim como o percentual mínimo de participação do Estado, subsequentemente ao processo de desestatização, para que este permaneça com a prerrogativa de exercício de veto em deliberações da Companhia.

Art. 3º da Lei Estadual n.º 17.853/23

Artigo 3° – O estatuto social da companhia deverá contemplar a previsão de ação preferencial de classe especial, de propriedade exclusiva do Estado de São Paulo, nos termos do § 7° do artigo 17 da Lei federal n° 6.404, de 15 de dezembro de 1976, que dará o poder de veto nas deliberações sociais relacionadas à:
I – denominação e sede da companhia;
II – alteração do objeto social que implique supressão da atividade precípua de prestação de serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário;
III – disciplina prevista no estatuto social da companhia quanto aos limites ao exercício do direito de voto atribuído a acionistas ou grupo de acionistas.

Mesmo reconhecendo a possível relevância da golden share para apoiar o interesse público, a inclusão imotivada deste instrumento em processos de desestatização que não demandem a manutenção de poderes especiais para o Estado pode, inclusive, representar franco prejuízo ao interesse coletivo, principalmente por considerar o possível impacto na formação do preço de venda e do procedimento necessário para sua extinção:

Golden shares: bala de prata ou instrumento ultrapassado?

Por Renato Ferreira dos Santos, Thiago Cardoso Araújo
JOTA, 30 de janeiro de 2019

No plano de Direito Administrativo e Econômico, questiona-se que a criação de golden shares que atribuíssem direitos de veto ao ente desestatizante sobre questões tão relevantes como a venda de seu controle acionário e a participação em joint ventures ou parcerias comerciais (além de outras questões empresariais estratégicas, a depender do caso concreto) poderia representar restrições indevidas sobre a livre circulação de capitais e ativos e/ou empecilhos ilícitos sobre a livre iniciativa e a livre concorrência.

Nessa vertente, enxerga-se a instituição de golden share num processo de alienação societária como uma “privatização pela metade”, com a manutenção da ingerência estatal sobre a companhia, muito embora a privatização decorra da percepção de que a companhia presta atividade econômica em sentido estrito, cuja titularidade precípua é da livre iniciativa. […]

Não deve o instituto da golden share ser tido como “bala de prata”, aplicável em larga escala às operações de desestatização, sob pena de produzir consequências tão deletérias quanto indesejáveis, que não podem ser ignoradas. Impossível ignorar que a alienação de controle com a criação dessa ação de classe especial em favor do ente público reduz significativamente o valor de mercado do ativo objeto da desestatização e, consequentemente, o montante dos recursos auferidos pelo Estado como resultado de tais operações. Trata-se da natural precificação da manutenção da ingerência estatal e consequente redução da autonomia do novo controlador. […]

Anote-se, ainda a esse respeito, que a conservação de golden share implica, na prática, a preservação de influência residual do Estado na companhia objeto da desestatização – ainda que despido da condição de acionista controlador –, que é traço característico (embora pouco saudável, em muitas oportunidades) do capitalismo de laços atualmente verificado no País.

A adoção do mecanismo, porém, não deve ser demonizada, na medida em que pode cumprir finalidades pontuais e/ou transitórias – mas não irrelevantes – sobretudo em relação a atividades com histórico de forte regulação, como no caso da aviação de defesa (Embraer) e de resseguros (IRB).

Pode, portanto, ser adotado com a mesma finalidade de resguardar interesses nacionais, mas se limitando a conferir ao titular da ação especial direitos restritos, como o veto à eventual supressão de atividades do objeto social. Ficariam excluídas, assim, prerrogativas irrestritas como o veto em operações societárias e/ou parcerias empresariais (que interferem de modo mais incisivo na liberdade empresarial e na circulação de capitais), assim como outras referentes a questões que não se revestem de natureza estratégica, como a alteração da denominação social.

Outra alternativa – talvez de aplicação mais simples – seria a manutenção da golden share apenas por prazo determinado, o qual serviria como período de transição para um regime inteiramente privado, até que o Estado possa desenhar outros meios de lidar e regular – se assim julgar necessário – eventuais riscos decorrentes da atividade exercida pela companhia objeto da desestatização, desfazendo-se, então, da ação especial.

[…]

Tendo em conta que a criação de golden share é, em essência, modalidade regulatória (intrassocietária), a decisão de adotar, ou não, o mecanismo passa pela necessidade de análises de custos e benefícios e de impactos regulatórios resultantes de sua implementação (consideradas todas as vantagens e desvantagens acima destacadas, dentre várias outras), além de outras técnicas de aprimoramento regulatório que possam, conforme o caso, contribuir com a melhor tomada de decisão em prol dos acionistas, do mercado e do país.

Extinção de ‘golden share’ cabe ao Congresso, decide TCU

Valor Econômico. 12 de outubro de 2020. Murillo Camarotto

[…]

o Tribunal de Contas da União (TCU) decidiu hoje que o governo precisa de aval do Congresso Nacional para extinguir as ações de classe especial que mantém em empresas privatizadas. Mais conhecida como “golden share”, essa ação reserva alguns direitos extraordinários ao governo, principalmente poder de veto para operações estratégicas que a companhia queira fazer.

[…]

Além de submeter ao Congresso a decisão de extinguir essas ações, o TCU entende que não há necessidade de nenhum tipo de indenização pelo fim da golden share. Em seu voto, Walton Alencar defendeu a tese de que a eliminação pura e simples tem um valor financeiro relevante, pois representaria o fim da possibilidade de qualquer interferência do governo.

[…]

Atualmente, a União detém ações de classe especial no capital da mineradora Vale, do Instituto Brasileiro de Resseguros (IRB) e da fabricante de aeronaves Embraer, cuja parceria com a americana Boeing foi aprovada recentemente pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Também chegou a ser discutida – e em seguida descartada – a instituição da golden share na Eletrobras, que está em processo de privatização.

Essas discussões revelam que a presença do Estado como player diretono mercado, a partir da atividade das empresas estatais, não pode ser reduzida a uma chave binária de eficiência em comparação ao setor privado. Como visto, nem sempre as estatais serão menos eficientes do que as suas concorrentes privadas.

Isto ocorre especialmente em contextos em que há um acentuado interesse público a ser perseguido e não houver condições que atraiam o particular, mesmo diante de existência de regulação apropriada e fomento. Um exemplo dessa situação é a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf)[3], empresa pública com a missão de promover o desenvolvimento integrado e sustentável de bacias hidrográficas e reduzir desigualdades regionais. Apesar do relevante interesse público envolvido e dos incentivos estabelecidos para alcançá-lo, essa atuação pode não representar grandes atrativos para a iniciativa privada (justificando, em última análise, a criação de uma estatal para a exploração dessa atividade).

Por outro lado, existe uma zona cinzenta da atuação direta do Estado, como a eventual necessidade de que sejam praticadas tarifas módicas na cobrança de prestação de serviços essenciais. Em linhas gerais, as tarifas módicas são aquelas mantidas em níveis acessíveis a fim de garantir que a população tenha acesso a serviços públicos fundamentais. No entanto, essas tarifas podem se mostrar insuficientes para arcar com todos os custos de operação e investimento, sendo necessário recorrer a subsídios estatais. Não se pode perder de vista que, em situações como essa, quem pagará pelo serviço, no final do dia, é a sociedade – seja diretamente (enquanto usuário do serviço) ou indiretamente (como contribuinte) –, sendo as opções constitucionalmente possíveis e politicamente legítimas, a depender do funcionamento da democracia.

Aliás, a própria estratégia de atuação empresarial do Estado não é dicotômica. Vai muito além de simplesmente decidir criar uma empresa estatal ou deixar a exploração de determinada atividade para o setor privado. É preciso analisar de há algum relevante interesse social envolvido, ou um imperativo de segurança nacional, que justifica a criação de uma nova estatal. Não estando presentes tais requisitos, esse espaço deve ser preenchido pela iniciativa privada – sem prejuízo de incidir algum influxo regulatório sobre essa atuação do particular[4].

Mesmo quando não se justifica sua presença como agente direto, ainda subsiste um grau de complexidade que impõe a escolha a partir de um leque de possíveis soluções empresariais pelo Estado. Dentre elas, cita-se a adoção do regime de monopólio, conforme era a opção do constituinte originário em relação à exploração de hidrocarbonetos[5], e como até hoje é a situação do serviço postal nacional. Em outros casos, é possível até mesmo optar pela privatização plena, como ocorreu com o Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), originalmente sociedade de economia mista que atuou em regime de monopólio estatal no setor de resseguros por mais de 70 anos, até a sua privatização em 2013.

Entre esses dois polos (monopólio estatal ou privatização total), ainda subsiste a opção pelas categorias intermediárias de atuação estatal. Dentre as estratégias estudadas nesta aula, destacam-se a criação de golden shares ou a participação minoritária (porém, estratégica) do Estado em empresas privadas.

Somente a partir da compreensão dos instrumentos disponíveis, bem como das diferenças específicas de cada contexto econômico que levam a diferentes possibilidades de decisões empresariais por parte do Estado, é que se torna possível compreender, sem qualquer compromisso ideológico previamente estabelecido, quais os rumos do neoempreendedorismo estatal no Brasil.


[1] Sundfeld, Carlos Ari; Rosilho, André. Empresas Estatais e Contratos sem Licitação. In: Nunes Júnior, Vidal Serrano; et al. Enciclopédia Jurídica da PUCSP (tomo XI): direito administrativo e constitucional. 2. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2022. p. 12.

[2] Freire, André Luiz. Direito dos contratos administrativos. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2023. p. 149.

[3] A Codevasf foi criada pela Lei nº 6.088/1974. Conforme dispõe o art. 5º do seu Estatuto Social: “A Codevasf tem por objeto social o desenvolvimento das bacias hidrográficas de forma integrada e sustentável, contribuindo para a redução das desigualdades regionais.”

[4] Isto é, mesmo quando não atua diretamente na economia por intermédio das empresas estatais, o Estado ainda poderá ter sua presença justificada enquanto ator regulatório no mercado ou como agente de fomento.

[5] Foi somente com a edição da Emenda Constitucional nº 09, em 1995, que ocorreu a flexibilização do até então rígido regime de monopólio que a União, por meio da Petrobras, mantinha sobre a pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural (art. 177 da CRFB/88).

3. DEBATENDO

  1. O que é o Estado empreendedor? A finalidade das empresas estatais é a mesma das empresas privadas?
  2. É possível precisar se o regime jurídico aplicável às empresas estatais é de direito público ou privado?
  3. O Estado, na condição de acionista controlador, pode tomar decisões voltadas ao interesse público primário em detrimento do direito de acionistas minoritários de capital privado?
  4. Há alguma diferença entre os casos envolvendo a Petrobras (controle de preço) e a Eletrobras (renovação de concessões) apresentados no Material de Leitura?
  5. Quais os critérios que demandam a escolha do parceiro privado na oportunidade de negócio (art. 28, § 3º, inciso II, da Lei Federal nº 13.303/2016)? Esta estratégia societária representa ofensa ao princípio da impessoalidade?
  6. Em sua opinião, a aquisição de participação minoritária de uma companhia pelo Estado é uma estratégia societária válida?
  7. No entendimento do Tribunal de Contas da União, o que configura uma empresa subsidiária?
  8. Uma empresa estatal que não gera lucro deve necessariamente ser desestatizada? Sob quais argumentos?
  9. Considerando os trechos da “Exposição de Motivos do Projeto de Lei Estadual nº 1.501/2023” e do texto “Golden shares: bala de prata ou instrumento ultrapassado?”, você considera que a inclusão de golden share no processo de desestatização da SABESP foi adequada? Por quê?
  10. Com base em seus conhecimentos e, considerando a leitura de todo o material, você considera que as estatais são menos eficientes que as empresas privadas?
  11. Tendo em vista que o regime jurídico é essencialmente mais próximo do direito privado, a atuação do Estado empreendedor deve ser focada exclusivamente na maximização do lucro (interesse público secundário) ou se faz necessário, também, a busca pelo interesse coletivo (interesse público primário)?
  12. No caso de uma empresa com participação de capital privado, o velho dogma da “supremacia do interesse público” é aplicável?
  13. O capital privado (acionistas minoritários) possui garantias de seus direitos ou o investimento em empresa estatal pressupõe uma “anuência” para a tomada de ações distintas da máxima rentabilização do capital?

4. APROFUNDANDO

Para aprofundamento do tema objeto desta aula, sugerimos a seguinte bibliografia complementar:

Aragão, Alexandre Santos de. Empresas estatais: o regime jurídico das empresas públicas e sociedades de economia mista. 2ª ed., São Paulo: Forense, 2018. 

Cunha, Cláudia Polto da; Mastrobuono, Cristina M. Wagner.  Privatizações, participações minoritárias e subsidiárias. In: Junior, Mario Engler Pinto; Mastrobuono, Cristina M. Wagner; Megna, Bruno Lopes (Coord.). Empresas Estatais: regime jurídico e experiência prática na vigência da Lei n. 13.303/2016. São Paulo: Almedina, 2022.

Cyrino, André Rodrigues. Até onde vai o empreendedorismo estatal? Uma análise econômica do art. 173 da Constituição. In: Aragão, Alexandre Santos de (Coord.). Empresas públicas e sociedades de economia mista. 1ª ed.  Belo Horizonte: Fórum, 2015.

Coase, R. H. The Nature of the Firm. Economica n. 4, november, 1937.

Fidalgo, Carolina Barros. O Estado empresário. Rio de Janeiro: Editora Almedina, 2017.

Jensen, M. C.; Meckling, W. H. Teoria da firma: comportamento dos administradores, custos de agência e estrutura de propriedade. RAE-Revista de Administração de Empresas, [S. l.], v. 48, n. 2, p. 87–125, 2008. Disponível em: https://periodicos.fgv.br/rae/article/view/36604. Acesso em: 3 fev. 2025.

Marrara, Thiago; Maffioletti, Emanuelle Urbano. Intervenção direta do Estado na economia por participações minoritárias: formas, requisitos e razoabilidade. Revista de Direito Público da Economia – RDPE, Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 181-203, abr./jun. 2016.

Moreira, Egon Bockmann e Kato, Mariana Almeida. A golden share e o poder de controle do Estado nas sociedades anônimas privadas. In: Ribeiro, Macia Carla Pereira (Org.);

Klein, Vinicius. Reflexões acerca do direito empresarial e a análise econômica do direito. Curitiba: GEDAI-UFPR, 2014.

Silva, Rodrigo Crelier Zambão da. A captura das estatais pelo regime jurídico de direito público: algumas reflexões. In: Aragão, Alexandre Santos de (Coord.). Empresas públicas e sociedades de economia mista. 1ª ed.  Belo Horizonte: Fórum, 2015.

Junior, Mário Engler Pinto. Empresa estatal: Função Econômica e Dilemas Societários. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2013.

Schwind, Rafael Wallbach. O Estado acionista: empresas estatais e empresas privadas com participação estatal. Rio de Janeiro: Editora Almedina, 2017.