1. CONHECENDO O BÁSICO
A política de preços de combustíveis no Brasil sempre foi um tema de extrema importância, dado o impacto econômico e social que ela provoca em várias camadas da sociedade.
No centro desta discussão está a Petrobrás, uma sociedade de economia mista que, ao longo de sua história, teve que balancear dois interesses aparentemente antagônicos: de um lado, a necessidade de gerar lucros e manter uma operação sustentável como empresa de capital aberto; de outro, a sua responsabilidade social enquanto fornecedora de energia para um país com uma economia sensível às flutuações dos preços dos combustíveis.
Dada a importância estratégica da Petrobrás e sua posição de liderança no setor de petróleo e gás, suas políticas de preços são frequentemente objeto de intenso debate, envolvendo questões técnicas, econômicas e políticas.
Além disso, os preços dos combustíveis impactam diretamente a inflação, afetando todos os setores da economia, além de acionistas e investidores. A logística e o transporte dependem fortemente de combustíveis como o diesel, e o preço da gasolina afeta o poder de compra das famílias, influenciando o custo de vida de milhões de brasileiros.
O tema da política de preços da Petrobrás ocupa um lugar central não apenas na esfera econômica, mas também nos campos do Direito Administrativo e Societário. Como uma sociedade de economia mista, a Petrobrás deve seguir as normas de governança corporativa estabelecidas pela legislação societária, ao mesmo tempo em que é submetida às diretrizes de intervenção estatal previstas no Direito Administrativo. Esse equilíbrio entre os interesses públicos e privados torna a gestão da política de preços um exemplo prático dos desafios enfrentados por empresas que possuem o Estado como acionista majoritário.
Dessa forma, a política de preços da Petrobrás transcende a simples definição de valores de mercado e se insere no centro das discussões sobre o papel do Estado na regulação de sociedades de economia mista, bem como no equilíbrio entre o lucro corporativo e a função social dessas empresas.
A relevância deste tema também reside em seu caráter de política pública. A intervenção do Estado nas políticas de preços visa a garantir o abastecimento e a estabilidade econômica, mas, ao mesmo tempo, essa intervenção pode entrar em conflito com os princípios de autonomia empresarial e a proteção de investidores privados.
Ao pensar na regulação da Petrobrás, o Direito Administrativo e o Direito Societário enfrentam dilemas complexos. Um dos maiores desafios é equilibrar a autonomia empresarial, essencial para atrair investidores e garantir a competitividade da empresa, com a intervenção estatal em nome do interesse público. Esse equilíbrio é particularmente difícil em sociedades de economia mista, onde o Estado é ao mesmo tempo regulador e acionista majoritário.
Do ponto de vista do Direito Societário, o dilema central é qual o limite da proteção aos direitos dos acionistas minoritários, que podem ser prejudicados pela interferência estatal nas decisões de gestão, como a política de preços.
O caso da Petrobrás durante os governos Dilma Rousseff e Michel Temer ilustra bem essa questão. No governo Dilma, a decisão de manter os preços dos combustíveis artificialmente baixos, visando a controlar a inflação, gerou prejuízos significativos para a companhia e, por consequência, para seus acionistas. Já no governo Temer, a adoção do Preço de Paridade de Importação (PPI) trouxe um alívio para as finanças da Petrobrás, mas gerou críticas sociais devido à alta dos preços dos combustíveis.
Esse cenário também envolve o conceito de dever fiduciário da administração da Petrobrás em relação aos seus acionistas. O dever de diligência e lealdade, previstos na Lei das Sociedades Anônimas, exige que os administradores busquem sempre o melhor interesse da empresa, mas, em uma sociedade de economia mista, esse interesse pode entrar em conflito com o interesse social, representado pelo controle dos preços em períodos de crise.
O Direito Administrativo, que tem como um de seus pilares a regulação da relação entre o Estado e a iniciativa privada, especialmente quando o Estado é parte integrante dessa iniciativa, como no caso da Petrobrás. A principal preocupação do Direito Administrativo, nesse contexto, é garantir que as ações do Estado, mesmo enquanto acionista majoritário de uma empresa de economia mista, sigam princípios constitucionais e respeitem o interesse público.
No caso específico da política de preços de combustíveis, o Direito Administrativo busca assegurar que as decisões da Petrobrás sejam compatíveis com o bem-estar social, sem comprometer a sua eficiência econômica. A intervenção do Estado em questões econômicas, como a fixação de preços, deve observar os princípios da legalidade, da eficiência, da moralidade e, sobretudo, do interesse público. Isso porque as políticas de preços afetam diretamente os consumidores e podem provocar efeitos colaterais como a inflação ou a escassez de produtos essenciais.
Portanto, entender a lógica por trás da política de preços da Petrobrás é essencial para compreender o funcionamento do Estado brasileiro em áreas estratégicas, além de revelar os dilemas e desafios inerentes à gestão de uma sociedade de economia mista.
Para iniciarmos…
- Como você vê o papel do Estado enquanto acionista majoritário em uma sociedade de economia mista como a Petrobrás? É possível conciliar o interesse público com os interesses dos acionistas minoritários?
- Em que medida o dever fiduciário dos administradores da Petrobrás em relação aos acionistas pode ser comprometido por decisões governamentais? Existe uma forma de proteger os administradores dessas pressões?
- É possível argumentar que a política de preços da Petrobrás deveria ser inteiramente desvinculada das políticas públicas do governo? Quais as consequências jurídicas e econômicas dessa desvinculação?
No caso de uma decisão judicial ou arbitral que proíba interferência política na política de preços da Petrobrás, como você vê o impacto dessa decisão na governança da empresa? Isso poderia criar precedentes para outras sociedades de economia mista?
2. CONECTANDO-SE COM A REALIDADE JURÍDICA E ADMINISTRATIVA
Para fomentarmos o debate, trazemos algumas notícias da época das alterações das políticas de preços da Petrobrás, que já era criticada antes das últimas mudanças
Os custos da política de preços da Petrobras para a sociedade
Carta Capital, 24.09.2021
Disponível em:
https://www.cartacapital.com.br/opiniao/os-custos-da-politica-de-precos-da-petrobras-para-a-sociedade/
Os que defendem a adoção do PPI pela empresa como estratégia corporativa se silenciam quanto aos custos dessa política para a sociedade
Por Henrique Jager para Carta Capital 24.09.2021
Desde outubro de 2016, poucos meses após a posse de Pedro Parente na presidência da Petrobras, a companhia vem adotando a política de Preços de Paridade de Importação (PPI), que vincula automaticamente o preço dos derivados nas refinarias ao comportamento do preço do produto em dólares no mercado internacional, acrescido dos custos de transporte e de uma taxa de 5%, para mitigar possíveis riscos. Assim, os preços no mercado interno passaram a ser definidos com base no comportamento do preço no mercado internacional, do cambio e dos custos de transporte, sem nenhuma vinculação com os custos de produção nas refinarias nacionais. Com a implantação dessa política todo o faturamento da estatal brasileira passou a ter como um dos principais
essa política. Como resultado, o custo ficou para a sociedade brasileira, como mostra a tabela abaixo que destaca a evolução do IPCA/IBGE e dos preços da Gasolina A, do Diesel e do GLP (gás de cozinha), entre outubro de 2016, quando a política foi adotada, e agosto de 2021. O preço do Diesel, que foi subsidiado em parte do período em destaque, subiu mais que duas vezes acima do custo de vida; a gasolina A, mais de três vezes e o GLP, que afeta diretamente a renda do estrato mais pobre da população brasileira, cresceu 211,26% no período, enquanto o IPCA acumulou 23,63%.
Um dos elementos por trás dessa política era formar uma operação de “hegde ampliada” permanente, sem pagar nada por isso. Como explica o especialista Alexandre Assaf Neto, o “Hedge funciona como um seguro, uma proteção, visando reduzir ou até eliminar o risco.” Se eu tenho uma dívida em dólares, por exemplo, muitos players buscam se proteger de possíveis desvalorizações do câmbio, para evitar o aumento da dívida em reais, por meio das operações de hedge.
No passado, a Petrobras foi julgada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) pela contabilização do hedge natural das dívidas em dólares como estratégia de proteção contra possíveis flutuações de preços dos produtos exportados. O corpo técnico da autarquia entendeu que essa operação feria a legislação brasileira, interpretação que não prevaleceu entre os diretores da CVM, que optaram por considerar a prática da estatal legal. Mas a prática atual vem passando sem nenhum questionamento por parte do órgão regulador. Isso porque apesar de funcionar como um grande “hedge ampliado”, provavelmente o maior do mundo, e sem pagar um centavo por isso, a empresa não contabiliza como tal. Sobra apenas o custo desta prática para a sociedade brasileira.
Política semelhante foi adotada pela Petrobras em 2002, interrompida entre 2003 e 2016, para voltar com força e maior profundidade no final de 2016. A tabela a seguir relaciona o linear múltipla – R²). Em outras palavras, a tabela mostra o quanto da variação dos preços da gasolina A, do diesel e do GLP cobrado pela Petrobras é explicada pelas variações do preço do barril de petróleo e do câmbio, para três períodos distintos.

Como se pode observar, em 2002 os preços da Petrobras para os derivados em destaque guardavam uma forte relação com o câmbio e com o preço do barril do Brent, principalmente o diesel e a gasolina. Entre 2003 e 2016 a situação muda radicalmente, e outros fatores, como a estrutura de custos internos, são incorporados pela empresa na definição do preço cobrado ao distribuidor. Importante destacar que o preço do GLP ficou praticamente constante entre os anos de 2003 e 2015, com um coeficiente de determinação de 22% com o câmbio e o barril do Brent, passando a subir a partir de então com mais força, o que influencia inclusive o coeficiente de determinação do período 2003 e 2016 apontado na tabela acima.
Esse período de implantação da política do “Hedge Ampliado” permanente, apresenta forte determinação dos preços dos derivados no mercado brasileiro por parte do câmbio e do barril do Brent. Não fosse a política de subsídio ao diesel implantada em 2017 que permitiu que o preço do diesel não acompanhasse diretamente as flutuações do preço no mercado internacional e do câmbio, o coeficiente de determinação seria maior que 80% nos três derivados em destaque, entre nov./16 e ago./21. Após a saída de Pedro Parente da presidência da Petrobras, em 2017, como consequência da reação da sociedade capitaneada pela greve dos caminhoneiros contra a adoção do PPI, já passaram três diferentes presidentes pela companhia, considerando o atual, mas a essência da política de PPI se mantém, muito em função do lobby dos grandes importadores de derivados que viabilizam seu negócio com essa política e recorrem inclusive ao Conselho de Administrativo de Defesa Econômica (CADE) para fazer valer seus interesses.
Assim como, dos fundos de investimento nacionais e preços, bem como se vinculam a instituições nacionais – como o IBP e o CBIE – para explicitarem as “supostas benesses” dessa política. As consequências para a sociedade brasileira da adoção do PPI são enormes, seja na aquisição direta dos produtos mais caros, seja no impacto que provoca nos custos dos demais segmentos da economia, impactando de forma generalizada no custo de vida, que acumulou 9,69% nos últimos 12 meses, medido pelo IPCA, e tende a continuar crescendo pressionado pelos custos crescentes da energia. O legado de Pedro Parente e sua política de “Hedge permanente” a custo zero para empresa extrapola o ambiente corporativo da companhia e vem se mostrando um problema crescente para a estabilidade monetária do país, para a retomada do crescimento econômico e, consequentemente, contribuindo para o aumento da insegurança alimentar e da pobreza extrema no país.
Chama a atenção que os mesmos que defendem a adoção do PPI pela Petrobras como estratégia corporativa se silenciam quanto aos custos dessa política para a sociedade como um todo, muitas vezes se posicionando contra a implantação de mecanismos que protejam a sociedade do aumento abusivo dos preços dos derivados de petróleo como a implantação de um estoque regulador e a criação de um imposto sobre exportação de petróleo cru, de modo a capitalizar um fundo moderador dos preços destes produtos.
Em 2022, o então presidente da República, Jair Bolsonaro, teceu duras críticas à Petrobrás, solicitando que os preços dos combustíveis se estabilizassem.
‘A Petrobras não colabora com nada’, diz Bolsonaro sobre preço dos combustíveis
Carta Capital, 16.03.2022
Disponível em:
https://www.cartacapital.com.br/cartaexpressa/a-petrobras-nao-colabora-com-nada-diz-bolsonaro-sobre-preco-dos-combustiveis/
Nos últimos dias, o presidente tem pressionado a empresa a segurar os reajustes
POR CARTA CAPITAL | 16.03.2022
O presidente Jair Bolsonaro voltou a criticar, na terça-feira 15, a política de preços da Petrobras, que anunciou uma alta de 18,8% na gasolina, de 24,9% no diesel e de 16,1% no gás de cozinha. Em entrevista à TV Ponta Negra, do Rio Grande do Norte, o presidente chegou a afirmar que a empresa “não colabora com nada”.
“O petróleo chegou a 135 dólares na semana passada, agora caiu e está em 100. A gente está esperando, inclusive, ter um retorno da Petrobras para rever estes preços que foram absurdamente majorados na semana passada”, disse o ex-capitão. “Qualquer nova alta a gente vai desencadear, de nossa parte aqui, o processo para que o reajuste não chegue na ponta da linha para o consumidor. É impagável o preço dos combustíveis no Brasil. E lamentavelmente a Petrobras não colabora com nada”.
Nos últimos dias, o presidente tem pressionado a empresa a segurar os preços dos combustíveis. Segundo Bolsonaro, a Petrobras poderia ter esperado para fazer o anúncio do reajuste, uma vez que o governo publicou na própria sexta de noite, no Diário Oficial da União, um projeto que muda regras na cobrança do ICMS com a promessa de baixar os valores. “O reajuste da Petrobras não é de responsabilidade nossa, é exclusiva da Petrobras”, disse em evento no Palácio do Planalto. Por um dia, se a Petrobras tivesse esperado, teríamos apenas um aumento de 30 centavos no preço do diesel, e não um pouco mais de 90 centavos. A gente espera que a Petrobras acompanhe a queda de preços lá fora. Com toda a certeza ela fará isso daí.”
Antes mesmo do anúncio do reajuste, após declarações do adversário Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Bolsonaro reclamou política de preços e deu sinais de que pode demitir Silva e Luna. No fim de semana, ao ser questionado sobre a possibilidade de dispensa, informou que, em seu governo, qualquer um poderia sair.
Os ânimos se acirraram à época, a ponto de a ex-presidente, Dilma Roussef fazer comentários acerca da atuação do então presidente, haja vista que ele, segundo ela, possuía a prerrogativa de controlar a precificação dos combustíveis, pelo cargo que ocupava.
Responsabilidade pela alta nos combustíveis é de Bolsonaro, e não dos funcionários da Petrobras, diz Dilma
Carta Capital, 23.03.2022
Disponível em:
https://www.cartacapital.com.br/politica/responsabilidade-pela-alta-nos-combustiveis-e-de-bolsonaro-e-nao-dos-funcionarios-da-petrobras-diz-dilma/
A ex-presidente disse considerar como um ‘absurdo’ que o governo culpe a empresa pelo aumento nos valores; Bolsonaro tem dito para a Justiça cobrar esclarecimentos de diretores
Por Victor Ohana para Carta Capital – 23.03.2022
A ex-presidente Dilma Roussef (PT) culpou o presidente Jair Bolsonaro (PL) pela alta nos preços dos combustíveis, contrariando o discurso do governo federal de que a responsabilidade seria da Petrobras. Em discurso nesta quarta-feira 23, em uma live do Partido dos Trabalhadores na internet, a petista disse considerar “absurdo” que o chefe do Planalto transfira essa atribuição para os funcionários da estatal.
Dilma argumentou que Bolsonaro, no comando do Executivo, tem a prerrogativa de nomear a diretoria da Petrobras e de indicar parte dos integrantes do Conselho de Administração.
A ex-presidente lembrou ainda a decisão da gestão de Michel Temer (MDB), após o golpe de 2016, de adotar uma política que obrigou os preços internos acompanharem as oscilações do mercado internacional.
“Eu acho um absurdo que um presidente, que é responsável pela nomeação da diretoria da Petrobras e pela indicação de parte do Conselho, tente transferir para a empresa essa responsabilidade”, declarou, em entrevista à ex-ministra Ideli Salvatti. “A responsabilidade não é dos funcionários da Petrobras. A responsabilidade por essa política de paridade de preços internacional é do governo brasileiro.”
Segundo Dilma, não são os funcionários da estatal que são “mal intencionados” ou que “não levam em conta a economia popular”. A ex-presidente acusou o governo Bolsonaro de não ter “boa intenção em relação aos consumidores” dos combustíveis. “Eu acho fantástico como um presidente possa ir a público e transferir responsabilidades intrinsecamente dele para outros”, continuou. “Eu acho que, por trás dessa tentativa de demonizar a Petrobras, tem o interesse escuso de privatizá-la, esquartejando-a.”
[…]
Bolsonaro tem repetido o discurso de que não é responsabilidade dele o aumento nos preços dos combustíveis. Além de colocar a culpa na guerra da Ucrânia, o presidente da República tem expressado insatisfação com o presidente da Petrobras, o general Joaquim Silva e Luna, e dito que a Justiça deveria cobrar esclarecimentos do militar. “Se eu quiser trocar hoje o presidente da Petrobras, eu não posso trocar. Se eu quiser trocar hoje um diretor da Petrobras, eu não posso trocar. A Petrobras é praticamente independente. Então cobrem da Petrobras. Seria uma boa ação por parte de vocês”, declarou, em live da semana passada.
Independentemente dos ânimos e das disputas políticas da época, muito se questionava acerca da intervenção na empresa, pois mexia com toda a estrutura econômica do país.
Mais recentemente, em 2023, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mais uma vez, alterou a política de preços da estatal.
A atual política de preços da Petrobrás, implementada em maio de 2023, trouxe significativas mudanças em relação à anterior, que era baseada no Preço de Paridade de Importação (PPI). Essa nova política abandona a fórmula estritamente ligada ao mercado internacional e passa a considerar dois componentes principais: o custo alternativo do cliente (baseado nas alternativas de suprimento) e o valor marginal para a Petrobrás (considerando o custo de oportunidade para produção, importação ou exportação).
Nova política de preços da Petrobras completa um ano com efeito reduzido sobre combustíveis
Estadão, 17/05/2024
Disponível em:
https://acervo.estadao.com.br/economia/nova-politica-precos-petrobras-1-ano-combustiveis/
O fim da política de paridade de importação (PPI) na Petrobras completa um ano nesta sexta-feira, 17, e a avaliação é que houve uma redução no preço dos combustíveis, porém tímida. O destaque foi o gás de cozinha, vendido, em média, 10% abaixo da cotação do mercado internacional, segundo levantamento do Observatório Social do Petróleo (OSP), ligado à Federação Nacional dos Petroleiros (FNP). A gasolina e o diesel tiveram reduções menores, em torno dos 5%. Nesses últimos 12 meses, a estatal cobrou o litro da gasolina, em média, 6% abaixo da cotação do mercado internacional, e o diesel S-10 se manteve 7% menor do que a paridade de importação.
O PPI foi adotado pela Petrobras em outubro de 2016, vigorando por seis anos e meio. Essa medida foi responsável pelos preços da gasolina, diesel e gás de cozinha mais altos da história do Brasil em 2022. Em maio, a estatal decretou o fim do PPI e anunciou uma nova estratégia comercial, que leva em conta o preço mínimo que a Petrobras considera vender e o preço máximo que o cliente se dispõe a pagar.
No último ano em que essa política de preços (PPI) esteve em vigor, o botijão de 13 quilos de gás de cozinha nas refinarias da estatal custava 23% acima do PPI, informou o Observatório. O levantamento, com base nos dados publicados pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), mostra que a Petrobras cobrava R$ 9,68 mais caro pelo botijão quando utilizava o PPI para calcular os preços dos combustíveis.
Com o fim dessa referência, o GLP passou a ser comercializado R$ 3,68 mais barato do que a paridade de importação. Quando a gestão da Petrobras implementou uma nova estratégia de preços, em 17 de maio do ano passado, eliminou o PPI do cálculo da gasolina e do diesel, mas manteve a referência para o gás de cozinha. “Inicialmente, o preço do GLP continuou sendo guiado pelas cotações de importação, mas houve uma inversão dessa prática no final de julho e, a partir daí, o preço vem sendo mantido abaixo do PPI”, explicou o economista do OSP e do Instituto Brasileiros de Estudos Políticos e Sociais (Ibeps), Eric Gil Dantas.
No último ano em que o PPI esteve em vigor – de 17 de maio de 2022 a 16 de maio do ano passado -, a gasolina era comercializada a 2,5%, em média, abaixo da paridade de importação, enquanto o diesel custava cerca de 0,4% a menos. O observatório comparou os dois períodos e constatou que, na vigência do PPI, a gasolina da estatal custava cerca de R$ 0,08 abaixo da referência internacional, valor que caiu para R$ 0,19 após a extinção da política de paridade de importação. O preço do diesel, durante a vigência do PPI, era apenas R$ 0,03 menor do que a referência internacional. A diferença saltou para R$ 0,26 após a eliminação dessa fórmula de preços.
Segundo o secretário-geral da FNP, Adaedson Costa, a futura presidente da Petrobras, Magda Chambriard, tem condição de nacionalizar de fato os preços, seja acelerando e ampliando a capacidade de refino no País, seja alterando a atual política de remuneração aos acionistas privados, marcada por dividendos recordes.
Em 2022, a Superintendência-Geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), instaurou o Inquérito Administrativo nº 08700.000212/2022-25, com o objetivo de apurar as alterações. Esse Inquérito segue em processamento e foi utilizado, inclusive, para questionar o novo governo sobre as mudanças ocorridas.
Cade pede informações à Petrobras sobre nova política de preços
G1, 17.05.2023
Disponível em:
https://g1.globo.com/economia/noticia/2023/05/17/cade-pede-informacoes-a-petrobras-sobre-nova-politica-de-precos.ghtml
Companhia anunciou ontem fim da paridade de importação do petróleo e nova política de preço para combustíveis. Conselho quer detalhes e documentos que levaram à decisão.
Por Ana Paula Castro para TV Globo – 17/05/2023
O Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) pediu nesta quarta-feira (17) explicações à Petrobras sobre a nova política de preços da companhia.
Ontem (16), a Petrobras anunciou o fim da paridade de preços do petróleo – e dos combustíveis derivados, como gasolina e diesel – com o dólar e o mercado internacional (veja mais abaixo).
No ofício enviado à companhia, o conselho pede:
- informações detalhadas que esclareçam os efeitos da nova estratégia comercial para definição de preços de diesel e gasolina da Petrobras; e
- apresentação de cópia dos documentos produzidos para subsidiar a decisão da Diretoria Executiva da Petrobras.
Os esclarecimentos devem ser enviados pela Petrobras à Superintendência-Geral do Cade até 1º de junho.
O pedido de informações faz parte de um inquérito administrativo aberto em janeiro de 2022 pela Superintendência-Geral do Cade para apuração de infrações à ordem econômica (possíveis condutas anticompetitivas praticadas pela Petrobras).
Nova política de preços
Nesta terça-feira, a Petrobras anunciou uma nova política para os combustíveis, que considerará duas referências de mercado:
- o “custo alternativo do cliente, como valor a ser priorizado na precificação”, e
- o “valor marginal para a Petrobras”.
O presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, afirmou ontem que a nova estratégia da companhia levará o cenário internacional como referência, mas com um “filtro”, que busca amortecer choques externos.
A política anterior, chamada de Preço de Paridade de Importação (PPI), entrou em vigor em 2016. Desde então, a Petrobras considerava o valor do petróleo no mercado global e custos logísticos como o fretamento de navios, as taxas portuárias e o uso dos dutos internos para transporte.
O estatuto social da Petrobrás prevê, no artigo 3º e seus parágrafos, as prerrogativas da estatal para orientação da União no exercício de suas atividades
Art. 3º do Estatuto Social da Petrobrás
Art. 3º- A Companhia tem como objeto a pesquisa, a lavra, a refinação, o processamento, o comércio e o transporte de petróleo proveniente de poço, de xisto ou de outras rochas, de seus derivados, de gás natural e de outros hidrocarbonetos fluidos, além das atividades vinculadas à energia, podendo promover a pesquisa, o desenvolvimento, a produção, o transporte, a distribuição e a comercialização de todas as formas de energia, bem como quaisquer outras atividades correlatas ou afins.
§3º- A Petrobras poderá ter suas atividades, desde que consentâneas com seu objeto social, orientadas pela União de modo a contribuir para o interesse público que justificou a sua criação, visando ao atendimento do objetivo da política energética nacional previsto no art. 1º, inciso V, da Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997.
§4º- No exercício da prerrogativa de que trata o §3º acima, a União somente poderá orientar a Companhia a assumir obrigações ou responsabilidades, incluindo a realização de projetos de investimento e assunção de custos/resultados operacionais específicos, como aqueles relativos à comercialização de combustíveis, bem como outras atividades correlatas, em condições diversas às de qualquer outra sociedade do setor privado que atue no mesmo mercado, quando: I- estiver definida em lei ou regulamento, bem como prevista em contrato, convênio ou ajuste celebrado com o ente público competente para estabelecê-la, observada a ampla publicidade desses instrumentos; e II- tiver seu custo e receitas discriminados e divulgados de forma transparente, inclusive no plano contábil.
§5º- Na hipótese dos §§3º e 4º acima, o Comitê de Investimentos e o Comitê de Minoritários, em suas atribuições de assessoramento ao Conselho de Administração, avaliarão e mensurarão, com base nos critérios de avaliação técnico-econômica para projetos de investimentos e para custos/resultados operacionais específicos praticados pela administração da Companhia, se as obrigações e responsabilidades a serem assumidas são diversas às de qualquer outra sociedade do setor privado que atue no mesmo mercado.
§6º- Quando orientada pela União a contribuir para o interesse público, a Companhia somente assumirá obrigações ou responsabilidades: I- que respeitem as condições de mercado definidas conforme §5º acima; ou II- que se adequem ao disposto nos incisos I e II do §4º acima, observados os critérios de que trata o §5º acima, sendo que, nesta hipótese, a União compensará, a cada exercício social, a Companhia pela diferença entre as condições de mercado definidas conforme o §5º acima e o resultado operacional ou retorno econômico da obrigação assumida.
3. DEBATENDO
Moot Court
Um moot court é uma simulação de julgamento ou audiência, onde os alunos atuam como advogados, julgadores, ou outras partes envolvidas em uma disputa jurídica fictícia ou real. O foco do moot court não é somente o resultado, mas o desenvolvimento de habilidades como:
- Argumentação jurídica – Os alunos devem construir e defender uma tese com base em fatos, doutrina e jurisprudência.
- Sustentação oral – As apresentações orais permitem que os alunos desenvolvam a capacidade de expor suas ideias de forma clara e persuasiva.
- Preparação de peças jurídicas – Na fase escrita, os participantes devem redigir memorandos que contenham uma fundamentação sólida, envolvendo a análise crítica das leis aplicáveis e decisões relevantes.
- Análise crítica – Durante o moot court, os alunos são incentivados a refletir criticamente sobre os temas jurídicos envolvidos, lidando com contradições e dilemas próprios do caso.
No caso específico da Petrobrás, os alunos são desafiados a lidar com questões de governança corporativa, intervenção estatal, direitos dos acionistas e a regulação de políticas de preços. Essas questões tocam em aspectos centrais do Direito Administrativo e do Direito Societário, exigindo uma análise interdisciplinar para que os alunos compreendam os múltiplos fatores em jogo.
O moot court oferece uma oportunidade para que os alunos experimentem, de maneira prática, a complexidade do raciocínio jurídico, além de prepará-los para situações reais, nas quais precisarão utilizar suas habilidades de pesquisa, escrita e argumentação para resolver problemas jurídicos, com base nas informações reais e fictícias fornecidas.
Deve-se considerar que embora esta avaliação seja baseada nas recentes discussões sobre a Política de Preços da Petrobrás, a narrativa processual de Processo Administrativo no CADE feita neste documento, para fins da avalição proposta, é fictícia, apenas para fins de simulação e construção de caso em estilo moot court. Embora fatos e documentos trazidos no âmbito de Inquéritos ou Processos Administrativos envolvendo a Petrobrás possam ser utilizados na defesa dos memoriais e na sustentação oral, os estudantes são instruídos a não considerar ordens processuais da Superintendência Geral do CADE ou o estágio atual de eventuais processos para apresentarem seus argumentos no âmbito desta avaliação.
Encontra-se sob instrução nesta Superintendência-Geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), o Processo Administrativo nº 0000.00.001/2022, em que são partes a Petrobrás (REQUERIDA) e a Procuradoria Federal Especializada (REQUERENTE).
O cerne do inquérito administrativo é entender se a Petrobrás abusa da posição de dominante no mercado por meio de sua política de preços.
Após realização de videoconferência realizada em conjunto com as Partes, esta Superintendência agendou audiência para os dias [definir datas] e determinou que as Partes apresentassem memoriais até [definir data], que deverão abordar exclusivamente os seguintes pontos:
Deve a União exercer esse poder em face da Petrobrás à luz do art. 177 da Constituição Federal, da Lei nº 13.303 e do art. 3º, §§3º, 4º e 5º do Estatuto Social da Petrobrás?
O novo modelo de preços da Petrobrás, que considera o custo alternativo do cliente e o valor marginal da empresa, fere os princípios da livre concorrência ou pode ser caracterizado como abuso de posição dominante, conforme o artigo 36 da Lei 12.529/2011?
A Petrobrás, ao adotar uma política de preços que busca maior previsibilidade e estabilidade para o mercado interno, pode estar desrespeitando os direitos dos acionistas minoritários, ao deixar de maximizar o lucro, conforme os deveres fiduciários previstos na Lei 6.404/1976?
A União, como acionista majoritária da Petrobrás, pode interferir na política de preços visando benefícios sociais, como a redução da inflação e a estabilização econômica, sem prejudicar os direitos dos acionistas minoritários?
FASE 01 – ESCRITA
Cada Equipe deverá preparar 2 (dois) memoriais que representaram as questões acima especificadas: 1 (um) memorial para a parte Requerente e 1 (um) memorial para a parte Requerida.
Os Memoriais deverão ser submetidos da seguinte forma: os Memoriais deverão ter: (i) papel tamanho A4; de 3 (três) a 5 (cinco) páginas cada, excetuando-se capa, referências, que deve ser dividida entre (a) base legal e interpretativa utilizada; e (b) evidências de fato invocados; (iii) margens superior, inferior, direita e esquerda de 2 (dois) cm; (iv) fonte Times New Roman, tamanho 12, espaçamento entre linhas 1,5 cm. Os Memoriais deverão ser submetidos; (v) nome dos representantes do grupo da disciplina na capa. Os Memoriais devem ser submetidos em formato PDF por meio da plataforma [a definir] até o dia [definir data].
Após pareamento de equipes a ser realizado pelo docente para a realização da fase oral, cada equipe poderá contestar a veracidade de fatos aduzidos nos Memoriais de outra equipe (cujas evidências devem estar na parte de Referências), até o dia [definir data].
FASE 02 – ORAL
Durante a realização dos painéis da audiência, é proibido aos oradores e equipe o uso de aparelhos eletrônicos, tablets, smartphones, relógios smartwatch e celulares em geral ainda que em modo avião, salvo para o uso de cronômetros.
Será permitido o uso de apresentações gráficas, PowerPoint ou qualquer outro recurso multimídia durante os Painéis, cabendo às equipes informar no início do respectivo Painel ao docente.
Cada equipe participará de 2 (dois) Painéis. Cada equipe poderá indicar até 2 (dois) integrantes, que disporão, conjuntamente, 15 (quinze) minutos para apresentar seus argumentos.
As equipes possuem direito de réplica e tréplica de no máximo 3 (dois) minutos.
Os professores poderão, a seu exclusivo critério, estender o tempo total de sustentação oral das equipes para além dos 15 (quinze) minutos.
Antes do início de cada Painel, as equipes devem buscar acordo quanto à ordem das apresentações e dos Oradores. Não obstante o consenso das Partes, o docente (Superintendência do CADE) poderá alterar a ordem das apresentações. Não havendo consenso, a questão será decidida pelo docente.
4. APROFUNDANDO
BOCATER, Maria Isabel do Prado. Poder de controle e influência significativa. In: Temas essenciais de direito empresarial: estudos em homenagem a Modesto Carvalhosa. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 833-845.
COMPARATO, Fábio Konder; SALOMÃO FILHO, Calixto. Poder de controle na Sociedade Anônima. Imprenta: Rio de Janeiro, Forense, 2014
FERNANDES, Edison Carlos. Demonstrações financeiras das sociedades anônimas. In: COELHO, Fabio Ulhôa. Tratado de direito comercial, volume 3: sociedade anônima. São Paulo: Saraiva, 2015, pp. 281-308.
PINTO JUNIOR, Mário Engler. Empresa estatal: função econômica e dilemas societários. São Paulo: Atlas S.A., 2010, p. 333-462.
SILVA, Alexandre Couto. Conflito de interesses: problemas de agência. In: SILVA, Alexandre Couto (Coord.). Direito societário: estudos sobre a lei de sociedades por ações. São Paulo: Saraiva, 2013, pp. 19-59