1. CONHECENDO O BÁSICO
O objeto desta aula é conferir uma ampla visão do sentido conferido no ordenamento jurídico brasileiro à improbidade administrativa, o seu alcance e âmbito de aplicação, a partir das alterações efetivadas na lei nº 8.429/1992 pela Lei nº 14.230/2021.
Nenhum texto constitucional anterior ao de 1988 ousou utilizar a expressão ato de improbidade administrativa, limitando-se a contemplar o enriquecimento ilícito, no exercício da função pública, de difícil demonstração. Entretanto, desde a primeira Constituição da República de 1891, a lesão à probidade administrativa foi prevista como crime de responsabilidade do Presidente da República, mantida nas constituições posteriores.
A Constituição Federal de 1988, democrática e instituidora do Estado de Direito, trouxe, no Capítulo VII, destinado à Administração Pública, a previsão expressa dos princípios administrativos no art. 37, caput. Também, o §4º, do referido artigo, determina que “Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”.
Observa-se que o dispositivo legal não definiu o que seria “ato de improbidade administrativa”, limitando-se a estabelecer algumas de suas possíveis consequências, quais sejam: as sanções de suspensão de direitos políticos e a perda da função pública; uma tutela provisória de urgência, a indisponibilidade de bens; e uma obrigação civil, o ressarcimento de danos.
Estando localizado no Capítulo da “Administração Pública” e trazendo como consequência a “perda da função pública”, conclui-se que a infração é atribuída a agente público.
Além disso, o dispositivo constitucional informa que o ilícito não tem natureza criminal ao afirmar que independe da “ação penal cabível”.
Especificamente em 02.06.1992, foi publicada a Lei de Improbidade Administrativa – LIA (Lei 8.429), dispondo sobre os atos de improbidade administrativa, com a finalidade de regulamentar o art. 37, § 4º da Constituição Federal.
A Lei nº 8.429/1992 surge como marco no combate aos desvios praticados no âmbito do Estado.
Com o seu advento, chegou-se a defender que a improbidade administrativa, combatida através de sanções graves, constituiria uma esperança de modificação no cenário político-administrativo brasileiro, fazendo com que somente dele participassem aqueles dispostos a atuar em prol da coletividade, colocando de lado a visão individualista, característica inegável de parte dos administradores públicos brasileiros.
A Lei 8.429/1992 reprime três modalidades de atos de improbidade administrativa: aqueles que levam ao enriquecimento ilícito (art. 9º); os que geram prejuízo ao erário (art. 10); e aqueles que violam os princípios administrativos (art. 11). Quanto aos atos de improbidade geradores de enriquecimento ilícito ou violadores de princípios administrativos, exigiu-se a presença do elemento subjetivo dolo para a sua caracterização. No que se reporta aos atos de improbidade por prejuízo ao erário, a lei, na sua versão original, admitia também a modalidade culposa.
Apesar de o vocábulo “improbidade” derivar do latim improbitate, significando desonestidade, desonradez, falta de probidade, a “improbidade administrativa” constante da Lei nº 8.429/1992 adquiriu contornos mais amplos. Chegou-se a se referir à improbidade como a violação a qualquer um dos princípios, desde que tal violação configurasse, concomitantemente, um dano mensurável, no aspecto moral ou material, à moralidade administrativa.
Desta forma, a improbidade vista através da Lei nº 8.429/1992, atendendo às expectativas constitucionais reveladas pela interpretação conjunta do caput do art. 37, da Constituição Federal, com o seu § 4º, abrangeu não somente aspectos morais, mas também os componentes dos demais princípios que regem a Administração Pública.
Com efeito, ímprobo não seria só o agente desonesto, que se serve da Administração Pública para angariar ou distribuir vantagens em detrimento do interesse público, mas também aquele que atua com menosprezo aos deveres do cargo e aos valores, direitos e bens que lhe são confiados. Seria, também, aquele que demonstra ineficiência intolerável para o exercício de suas funções.
Ocorre que, após três décadas de vigência da Lei de Improbidade Administrativa, muitas críticas foram lançadas aos tipos abertos estabelecidos, que levaram à propositura de milhares de ações de improbidade administrativa pelos legitimados – Ministério Público e pessoa jurídica lesada – muitas delas sem o devido cuidado de apontar o efetivo elemento subjetivo do tipo.
Arguiu-se o surgimento de uma “asfixia burocrática”, com a eliminação da indispensável dose de discricionariedade do administrador público, com o consequente “apagão de canetas”.
Essas e diversas outras questões levaram à necessidade de repensar a Lei de Improbidade Administrativa, no sentido de aprimorá-la, afastando-se possíveis inseguranças geradas na aplicação da norma e adaptando-a às disposições do novo Código de Processo Civil de 2015.
Todo esse processo de amadurecimento e debates instaurados em torno da LIA, levou à nova redação conferida à Lei de Improbidade Administrativa pela Lei nº 14.230, de 25.10.2021.
Agora, na perspectiva das inúmeras mudanças trazidas pela Lei nº 14.230/2021, pretende-se trazer o novo contexto material da improbidade administrativa. Ou seja, quais as condutas que hoje são enquadradas como improbidade administrativa? Melhor dizendo, o que era e o que se tornou a improbidade administrativa?
Essa análise será desprovida de viés crítico, buscando estabelecer os tipos de improbidade, com nova delimitação fixada pela Lei nº 14.230/2021.
2. CONECTANDO-SE COM A REALIDADE JURÍDICA E ADMINISTRATIVA
O elemento subjetivo exigido para configuração do ato de improbidade
A primeira observação necessária ao entendimento do atual alcance normativo da improbidade administrativa, fruto das alterações trazidas pela Lei nº 14.230/2021, é que todas as modalidades exigem a presença do dolo para a sua caracterização.
Diferente da redação original da Lei nº 8.429/199, que admitia a conduta culposa para caracterização da improbidade por prejuízo ao erário (art. 10), atualmente todos os tipos exigem a presença do elemento subjetivo dolo.
Nesse contexto, pode-se afirmar que houve uma retração no conceito da “improbidade administrativa” enquanto infração, pois hoje exige-se a conduta desonesta do agente público, ou seja, vinculada à ausência de honra, dignidade, decência.
Assim, estabelecem os §§1º, 2º e 3º do art. 1º, da Lei de Improbidade Administrativa, com a redação conferida pela Lei nº 14.230/2021:
Lei n.º 8.429/1992 – Lei de Improbidade Administrativa
§ 1º Consideram-se atos de improbidade administrativa as condutas dolosas tipificadas nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, ressalvados tipos previstos em leis especiais. (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)
§ 2º Considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente. (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)
§ 3º O mero exercício da função ou desempenho de competências públicas, sem comprovação de ato doloso com fim ilícito, afasta a responsabilidade por ato de improbidade administrativa. (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)
Explica variada doutrina que dolo e culpa são espécies de vínculo de aspecto psicológico que liga o autor ao fato por ele praticado. Afirma-se que age com dolo o “homem médio” que atua visando que seu ato contrarie o direito, ou que quer contrariar o direito e atua para isso. Majoritariamente, tem-se o dolo como um componente subjetivo implícito da conduta, pertencente ao fato típico, formado por dois elementos: o volitivo, isto é, a vontade de praticar a conduta descrita na norma, representado pelos verbos querer e aceitar; e o intelectivo, traduzido na consciência da conduta e do resultado.
Para fixação do dolo na improbidade administrativa, além da consciência da ilicitude, deve-se demonstrar o intento de alcançar o fim ilícito.
Corrobora com esse entendimento os §§1º e 2º, do art. 11, da LIA, que trata da improbidade por violação de princípios, senão vejamos:
Lei de Improbidade Administrativa
§ 1º Nos termos da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, promulgada pelo Decreto nº 5.687, de 31 de janeiro de 2006, somente haverá improbidade administrativa, na aplicação deste artigo, quando for comprovado na conduta funcional do agente público o fim de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade. (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)
§ 2º Aplica-se o disposto no § 1º deste artigo a quaisquer atos de improbidade administrativa tipificados nesta Lei e em leis especiais e a quaisquer outros tipos especiais de improbidade administrativa instituídos por lei.
Diante de tais dispositivos legais, muitos começaram a afirmar que a caracterização da improbidade administrativa está condicionada à demonstração do dolo específico.
Diferente do dolo genérico, que se revela pela simples vontade de cometer o ato, o dolo específico requer a intenção consciente de obter o enriquecimento ilícito para si ou para outrem, lesar o patrimônio público ou violar os princípios da Administração Pública.
É bom esclarecer que a comprovação do dolo na espécie será construída, na maioria das vezes, por elementos indiciários, pois dificilmente o mundo psíquico do agente de externará de forma plena, afinal, conforme expõe José de Farias Costa:
Direito Penal
Por José Faria Costa
Lisboa: Imprensa Nacional Casa da Moeda, 2017. p. 406
O uso pelo legislador de tais elementos especiais subjetivos (intenções, motivos, impulsos afetivos etc.) é extremamente delicado, pois raramente se materializam em fatos externos: na esmagadora parte dos casos, não extrapolam a esfera íntima do indivíduo. Até porque, “o mundo psíquico do agente é simplesmente inacessível ao conhecimento do intérprete ou julgador.
Diversos julgados apontam para necessidade de demonstração do dolo para a caracterização do ato de improbidade administrativa, em qualquer dos seus tipos:
STF, ARE 1436192
Relator ALEXANDRE DE MORAES, Data de Julgamento: 22/08/2023, Primeira Turma,
DIVULG 28-08-2023 PUBLIC 29-08-2023
EMENTA: AGRAVO INTERNO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA DE DOLO. ATO ÍMPROBO NÃO CONFIGURADO. 1. A ilegalidade, por si só, não é suficiente para configurar a conduta ímproba. No caso, o próprio Tribunal de origem concluiu que o agente público atuou sem o especial fim de agir, sem intenção clara de burlar as regras de contratação temporária. 2. Não demonstrada a existência clara do elemento subjetivo doloso, qualificado pela má-fé, não é possível responsabilizar o agente público de ato de improbidade administrativa. 3. Agravo Interno a que se nega provimento.
TJ-SP, AC: 00016275720138260172
Relator: Carlos von Adamek, 2ª Câmara de Direito Público
Data de Julgamento: 12/05/2023, Data de Publicação: 12/05/2023
AÇÃO CIVIL PÚBLICA – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – LICITAÇÃO – RESSARCIMENTO AO ERÁRIO – Para a configuração do ato de improbidade administrativa é imprescindível a presença do elemento subjetivo do dolo e da má-fé, o que não restou demonstrado nos autos – Ausência de qualquer indício de malversação de recursos públicos, dano ao erário ou enriquecimento ilícito – Meras irregularidades que não permitem reconhecer o dolo específico, em vista do art. 1º, §§ 2º e 3º da Lei nº 8.429/92, alterada pela Lei nº 14.230/2021 – Entendimento do C. STJ – Sentença alterada – Recursos providos.
TSE – RO-El: 060104626 RECIFE – PE
Relator: Min. Carlos Horbach,
Data de Julgamento: 10/11/2022, Data de Publicação: 10/11/2022
ELEIÇÕES 2022. RECURSO ORDINÁRIO ELEITORAL. REQUERIMENTO DE REGISTRO DE CANDIDATURA. DEPUTADO ESTADUAL. INDEFERIMENTO. INELEGIBILIDADE DO ART. 1º, I, G, DA LC 64/1990. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA NÃO CONFIGURADO, NOS TERMOS DA LEI 14.230/2021. INEXISTÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. DEFERIMENTO DO REGISTRO. PROVIMENTO DO RECURSO. 1. A nova redação da Lei de Improbidade Administrativa passou a exigir o dolo específico para a configuração do ato de improbidade administrativa. 2. Inexistência, no caso, do elemento subjetivo indispensável à configuração da hipótese de inelegibilidade tipificada no art. 1º, I, g, da LC 64/1990. 3. Provimento do recurso ordinário eleitoral, para afastar a inelegibilidade do art. 1º, I, g, da LC 64/1990 e deferir o registro de candidatura.
Tipos de improbidade administrativa
A Lei 8.429/1992, com as alterações dadas pela Lei n.º 14.230/2021, reprime três modalidades de atos de improbidade administrativa: aqueles que levam ao enriquecimento ilícito (art. 9º), os que geram prejuízo ao erário (art. 10) e os que violam os princípios administrativos (art. 11). Muitos dos atos de improbidades assemelham-se a crimes previstos no Código Penal, bem como no Dec-.lei 201/1967, legislação penal específica aplicada aos prefeitos, além das infrações estabelecidas na Lei nº 12.846/2013 (Lei Anticorrupção), que aborda a responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas.
a) Da improbidade por enriquecimento ilícito
Não são raros os casos daqueles que ingressaram no âmbito da Administração Pública em precária situação financeira e, após pouco tempo, já possuem um considerável acervo patrimonial. Não se quer com isso dizer que os administradores públicos estejam predestinados ao empobrecimento em razão do exercício de função pública, afinal, nada impede que, como qualquer outra pessoa, conheça acréscimo patrimonial com lucros em seus negócios. Porém, ao agente público, no exercício de suas funções, somente é permitido auferir as vantagens previstas em lei. Não pode beneficiar-se de vantagem patrimonial imerecida derivada do exercício do seu cargo.
O art. 9º da Lei 8.429/92, visando coibir situações desta natureza, trata dos atos de improbidade administrativa que importam em enriquecimento ilícito.
O núcleo central do tipo vem expresso no caput do artigo, segundo o qual:
Lei 8.429/92
Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando em enriquecimento ilícito auferir, mediante a prática de ato doloso, qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, de mandato, de função, de emprego ou de atividade nas entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente:
A vantagem indevida é fruto da utilização imprópria da função pública, voltada para a busca de benefícios privados, que se constituem em valor, presente ou futuro, com possibilidade de avaliação monetária.
Assim, todo o enriquecimento que esteja relacionado ao exercício da atividade pública e que não corresponda à contraprestação paga ao agente por determinação normativa, constitui vantagem indevida. Note-se, inclusive, que, na maioria dos casos previstos no art. 9º a vantagem patrimonial conferida ao agente público não provém dos cofres públicos, mas sim, de terceiros.
A incidência do art. 9º da LIA independe da ocorrência de prejuízo ao erário, observando-se que as hipóteses constantes do referido artigo demonstram preocupação primordial com o enriquecimento ilícito, sendo o prejuízo ao erário, em alguns casos, mera consequência do ato.
Valoriza-se o aspecto moral da obtenção da vantagem. Logo, o enriquecimento ilícito pode perfeitamente se verificar inclusive no campo da legalidade. Um exemplo, seria o caso do Chefe do Executivo que utiliza o seu poder com o propósito de fazer com que a Administração Pública honre suas obrigações com um seu credor determinado, em troca de vantagem patrimonial. Assim, a censura legal tem como alvo o desvio ético do agente, não se fazendo necessário que o ato praticado seja ilícito.
Doze incisos compõem o art. 9º, não sendo um rol taxativo, o que se verifica pelo uso da expressão “notadamente”, que na lei significa “principalmente”, “sobretudo”, abrindo espaço para apresentação de hipóteses exemplificativas.
A Lei nº 14.230/2021 pouca coisa mudou na redação original do art. 9º, tendo ocorrido apenas alterações da redação dos incisos IV, VI e VII, destacando-se a modificação deste último, senão vejamos:
Lei nº 14.230/2021
VII – adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, cargo, emprego ou função pública, bens de qualquer natureza cujo valor seja desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público; (Redação original)
VII – adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, de cargo, de emprego ou de função pública, e em razão deles, bens de qualquer natureza, decorrentes dos atos descritos no caput deste artigo, cujo valor seja desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público, assegurada a demonstração pelo agente da licitude da origem dessa evolução; (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)
A nova redação do inciso VII, do art. 9º deixa claro que deve existir nexo de causalidade entre a evolução patrimonial e o exercício do cargo, além de permitir ao agente público comprovar a licitude da origem do seu patrimônio.
Neste sentido, o ex-prefeito de Meio-Oeste, Santa Catarina, seus filhos e companheira, foram condenados por improbidade administrativa, com base no referido dispositivo legal. Segundo apurado, houve uma verdadeira evolução desproporcional de seu patrimônio e de seus filhos. O que antes era modesto, com carros populares e parte de imóveis herdados, passou a ter inúmeros imóveis, carros de alto padrão, referência à época, e aplicações bancárias. Em alguns anos, o valor de patrimônio, conforme declaração de Imposto de Renda, chegou a dobrar. Em resumo, o prefeito adquiria imóveis, com dinheiro sem origem comprovada, e transferia para os filhos e a companheira. As movimentações financeiras eram volumosas, incompatíveis com a evolução dos seus patrimônios e rendimentos de cada um (https://www.tjsc.jus.br/web/imprensa/-/ex-prefeito-e-familia-sao-condenados-a-devolver-mais-de-r-2-milhoes-no-meio-oeste).
Dentre as hipóteses exemplificativas constantes do art. 9º, a redação dos incisos VII, VIII, XI e XII revela o ilícito pela simples presença do dolo genérico. A título de exemplo, pode-se afirmar que constitui improbidade por enriquecimento ilícito incorporar ao patrimônio próprio bens integrantes do acervo patrimonial do ente público. Tal prática não exigirá prova de que houve a intenção de se beneficiar, uma vez que a incorporação de per si já constitui o benefício.
b) Da improbidade por prejuízo ao erário
O art. 10, da Lei 8.429/92, trata dos atos de improbidade administrativa que causam lesões ao erário. Segundo o caput do art. 10:
Lei 8.429/92
Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente:
Da mesma forma que o art. 9º, o art. 10 traz no caput o núcleo da conduta e mais vinte e dois incisos, enunciados exemplificativamente.
O referido artigo foi fortemente impactado com as alterações precedidas pela Lei nº 14.230/2021.
Inicialmente houve a retirada do tipo culposo. Antes da alteração efetivada pela Lei nº 14.230/2021, tanto incidia na hipótese do art. 10 o agente público que causasse, conscientemente, prejuízo ao erário em razão de sua conduta, como aquele outro que, mesmo não tendo previsto o dano ao erário, agisse de forma imprudente ou negligente. A distinção entre a conduta dolosa e culposa aproveitava apenas para fins de aplicação das sanções, incidindo para o segundo caso sanções menos severas, dentre as arroladas no art. 12, II, da LIA.
Atualmente, para incidência do art. 10 exige-se a vontade livre e consciente de praticar a conduta com a intenção de alcançar o resultado.
Saliente-se que a previsão da modalidade culposa na redação original da Lei nº 8.429/1992, despertou debates quanto a sua constitucionalidade, levando-se a questão ao Supremo Tribunal Federal. Em Plenário Virtual, ocorrido em 25.10.2024, o STF, decidiu por maioria de votos, no Recurso Extraordinário nº 656.558 apensado ao Recurso Extraordinário 610.523, que a modalidade culposa, então prevista para o art. 10 da redação original da Lei nº 8.429/1992, é inconstitucional.
A alteração do elemento subjetivo do tipo do art. 10 levou a relevante debate quanto a possibilidade de sua aplicação retroativa, especialmente para beneficiar réus de ações de improbidade já ajuizadas.
O Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário com Agravo 843.989/PR (Tema 1.119 da Repercussão Geral) entendeu que é irretroativa a norma benéfica da Lei nº 14.230/2021, que revogou os atos de improbidade administrativa por prejuízo ao erário na modalidade culposa, em relação à eficácia da coisa julgada, bem como durante o processo de execução das sanções.
Nada obstante, no mesmo julgamento o STF decidiu que, quanto aos atos de improbidade culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, sem condenação transitada em julgado, aplica-se a norma mais benéfica.
Outra alteração realizada pela Lei nº 14.230/2021 no art. 10 é a previsão da exigência de efetivo dano ao erário.
Em se tratando de danos patrimoniais decorrentes da prática de ato de improbidade administrativa, antes das alterações trazidas pela Lei nº 14.230/2021, admitia-se o dano presumido, ao menos na hipótese do art. 10, VIII, da Lei nº 8.429/1992, que tratava do prejuízo ao erário em razão de “frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente pode-se pensar na hipótese de lucros cessantes no caso do ente lesado”.
Nesse sentido manifestava-se reiteradamente os Tribunais Superiores, embalados pelo Superior Tribunal de Justiça, ao estabelecer que independe de prova fatos notórios e deduzidos das regras de experiência como, por exemplo, o prejuízo presumido em caso de fracionamento indevido do objeto licitado para permitir a dispensa de licitação e caracterizar a improbidade por prejuízo ao erário. Presumiu-se que os sistemas estabelecidos para contratação pela Lei de Licitações e Contratações Públicas garantiam a escolha da melhor proposta em ambiente de igualdade de condições. Vejamos:
“[…] é remansoso o entendimento desta Corte no sentido de que, nos casos de dispensa/inexigibilidade de licitação, o dano ao erário é presumido” (AREsp 1461963/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 25.9.2019). No mesmo sentido: REsp 1.431.610/GO, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 26.2.2019; REsp 1.507.099/GO, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 19.12.2019; AgRg no AREsp 617.563/SP, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 14.10.2016;
A redação trazida à Lei de Improbidade Administrativa pela Lei nº 14.230/2021, houve normativa contrária a tal entendimento, passando a exigir no referido inciso VIII, do art. 10, a “perda patrimonial efetiva”:
Lei nº 14.230/2021
Art. 10. (…) VIII – frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva;
No mesmo sentido, o § 1º, do art. 10, passou a estabelecer que:
Lei nº 14.230/2021
Art. 10. (…) §1º – Nos casos em que a inobservância de formalidades legais ou regulamentares não implicar perda patrimonial efetiva, não ocorrerá imposição de ressarcimento, vedado o enriquecimento sem causa das entidades referidas no art. 1º desta Lei:
A jurisprudência já acolhe a referida normativa. Vejamos:
TRF-5 – ApelRemNec n.º 08057212320184058202
Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL BRUNO LEONARDO CAMARA CARRA (CONVOCADO), 4ª Câmara
Data de Julgamento:25/01/2022
ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/92 COM AS ALTERAÇÕES TRAZIDAS PELA LEI 14.230/21. FRAUDE À LICITAÇÃO. DANO PRESUMIDO (IN RE IPSA). ATO ÍMPROBO NÃO CONFIGURADO. NECESSÁRIA A EFETIVA E COMPROVADA PERDA PATRIMONIAL. ART. 10º DA NOVA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. APELAÇÃO DO MPF NÃO PROVIDA. 1. Apelação civil interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, contra a sentença proferido pelo Juízo da 8ª Vara da Seção Judiciária da Paraíba, que julgou improcedente a ação civil pública por ato de improbidade administrativa, absolvendo os apelados da prática de ato ímprobo previsto no art. 10º, inc. VIII, da Lei 8.429/92. (…) 3. A jurisprudência col. Superior Tribunal de Justiça, até então, é no sentido de que a fraude à licitação, prevista no art. 10º, VIII, da LIA tem como consequência o dano presumido (in re ipsa), que gera lesividade apta a ensejar o ressarcimento ao erário, na medida em que o Poder Público deixaria de, por condutas de administradores, contratar a melhor proposta. Além do dano presumido, para caracterização do ato de improbidade administrativa, o entendimento é de que seria necessária à caraterização do ato de improbidade administrativa, ao menos, culpa. 4. Entretanto, com entrada em vigor da Lei 14.230/2021, que alterou a Lei 8.429/92, não prevalece mais a figura do dano presumido e nem o elemento subjetivo culpa, uma vez que a Lei de Improbidade Administrativa possui caráter penaliforme devido as sanções nela previstas, devendo ser aplicada à luz dos normativos penais. Em assim sendo, evidencia-se que a nova Lei, por ter conteúdo de ordem material mais benéfico aos acusados, deve ser aplicada a fatos ocorridos anteriormente à sua entrada em vigor. (…)9. Apelação do MPF não provida.”
O prejuízo ao erário característico do art. 10 se revela pela perda, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação. Perda é o extravio de uma coisa que se possuía. O desvio é o destino ou aplicação errada. A apropriação caracteriza-se pelo apoderamento, inversão de posse, permitindo que outrem transforme em seu, bem que não lhe pertence. Malbaratamento, por sua vez, seria o emprego ou aplicação indevido, ou seja, o gasto de forma inconveniente, com prejuízo. Por fim, a dilapidação é reconhecida como o esbanjamento, desperdício.
c) Da improbidade por violação de princípios
A improbidade por violação de princípios foi também impactada pela Lei nº 14.230/2021, que transformou o tipo exemplificativo em taxativo. Observe-se:
Lei nº 14.230/2021
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)
A submissão da atuação estatal aos princípios administrativos é norma constitucional explícita no art. 37, caput, da Constituição Federal. Assim, tanto na atuação vinculada, quanto na atividade discricionária, os agentes públicos têm o dever de atuar pautados em princípios administrativos.
Ocorre que, a interpretação literal do caput do art. 11, na sua redação original, também era capaz de levar a acoimar como ímprobas condutas meramente ilegais, gerando cenário de insegurança jurídica.
Celso Antônio Bandeira de Mello, manifestando-se quanto ao princípio da segurança jurídica afirma que:
Curso de Direito Administrativo
Por Celso Antônio Bandeira de Mello
São Paulo: Juspodivm/Malheiros, 2021. p. 108
“A ordem jurídica corresponde a um quadro normativo proposto precisamente para que as pessoas possam se orientar, sabendo, pois, de antemão, o que devem ou o que podem fazer, tendo em vistas as ulteriores consequências imputáveis a seus atos”.
Segundo Humberto Ávila:
Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos
Por Humberto Ávila
São Paulo: Malheiros, 2014. p. 96
“Os princípios estabelecem um estado ideal de coisas a ser atingido (state of affairs, idealzustand), em virtude do qual deve o aplicador verificar a adequação do comportamento a ser escolhido ou já escolhido para resguardar tal estado de coisas”
Por certo que a carga de significados que acompanha os princípios administrativos acaba por gerar certa insegurança quanto ao atingimento dos propósitos finalísticos contemplados. No âmbito da improbidade administrativa, tal desencontro de posições quanto à efetiva infração principiológica refletia-se em divergências de entendimentos jurisprudenciais.
Por exemplo: a inaplicabilidade do percentual mínimo destinado aos recursos direcionados à saúde ou à educação constitui ato de improbidade por violação de princípios? A afronta legal viola a finalidade da norma a ponto de caracterizá-la como improbidade?
Pesquisa jurisprudencial é capaz de indicar posições opostas entre os tribunais, o que confirma a ausência de uniformidade quanto às condutas caracterizadoras de improbidade por violação de princípios na redação original da LIA. Assim, na decisão monocrática nº 1335745, Min. Mauro Campbell, considerou como caracterizada a improbidade por violação de princípios a não aplicação do percentual mínimo na saúde. Em sentido contrário foi a decisão do STF no Recurso Extraordinário com Agravo: ARE nº 743560-PR.
A dinâmica legal adotada pela Lei nº 14.230/2021 estabeleceu o art. 11 como um tipo taxativo, com a descrição das condutas caracterizadoras da violação. Tal dinâmica se aproxima da segurança jurídica tão almejada pelos administradores públicos.
Com a nova redação legal, os 10 (dez) incisos estabelecidos exemplificativamente no art. 11, na redação original da Lei nº 8.429/1992, passam a ser 08 (oito) dispositivos taxativos. Assim, quatro foram revogados (I, II, IX e X), quatro tiveram suas redações alteradas (III, IV, V e VI), mantendo-se a redação original de apenas 2 (dois) incisos (VII e VIII), com o acréscimo de 02 (dois) novos (XI e XII).
Assim, tem-se as alterações constantes do art. 11:
Lei n.º 8.429/1992, com redação dada pela Lei n.º 14.230/2021
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)
I – praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;
I – (revogado); (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)
II – retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;
II – (revogado); (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)
III – revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das atribuições e que deva permanecer em segredo;
III – revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das atribuições e que deva permanecer em segredo, propiciando beneficiamento por informação privilegiada ou colocando em risco a segurança da sociedade e do Estado; (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)
IV – negar publicidade aos atos oficiais;
IV – negar publicidade aos atos oficiais, exceto em razão de sua imprescindibilidade para a segurança da sociedade e do Estado ou de outras hipóteses instituídas em lei; (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)
V – frustrar a licitude de concurso público;
V – frustrar, em ofensa à imparcialidade, o caráter concorrencial de concurso público, de chamamento ou de procedimento licitatório, com vistas à obtenção de benefício próprio, direto ou indireto, ou de terceiros; (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)
VI – deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo;
VI – deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo, desde que disponha das condições para isso, com vistas a ocultar irregularidades; (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)
VII – revelar ou permitir que chegue ao conhecimento de terceiro, antes da respectiva divulgação oficial, teor de medida política ou econômica capaz de afetar o preço de mercadoria, bem ou serviço.
VIII – descumprir as normas relativas à celebração, fiscalização e aprovação de contas de parcerias firmadas pela administração pública com entidades privadas. (Vide Medida Provisória nº 2.088-35, de 2000) (Redação dada pela Lei nº 13.019, de 2014) (Vigência)
IX – deixar de cumprir a exigência de requisitos de acessibilidade previstos na legislação. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
IX – (revogado); (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)
X – transferir recurso a entidade privada, em razão da prestação de serviços na área de saúde sem a prévia celebração de contrato, convênio ou instrumento congênere, nos termos do parágrafo único do art. 24 da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. (Incluído pela Lei nº 13.650, de 2018)
X – (revogado); (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)
XI – nomear cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas; (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)
XII – praticar, no âmbito da administração pública e com recursos do erário, ato de publicidade que contrarie o disposto no § 1º do art. 37 da Constituição Federal, de forma a promover inequívoco enaltecimento do agente público e personalização de atos, de programas, de obras, de serviços ou de campanhas dos órgãos públicos. (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)
Deve-se ressaltar a relevância do inciso XI, do art. 11, que busca punir agentes políticos em face da prática do nepotismo. Observa-se que o dispositivo repete os termos da Súmula Vinculante nº 13, do Supremo Tribunal Federal.
Visando consolidar o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, no RE 579.951 (Tema 66), segundo o qual a vedação de nomeação de parentes para cargos em comissão e funções de confiança estaria restrita a cargos e funções administrativas, não alcançando os cargos de Ministro e Secretário estadual distrital e municipal, o art. 11, trouxe a previsão constante do §5º, segundo a qual:
Lei n.º 8.429/1992
Art. 11 (…)§5º. Não se configurará improbidade a mera nomeação ou indicação política por parte dos detentores de mandatos eletivos, sendo necessária a aferição de dolo com finalidade ilícita por parte do agente”
Veja que o dispositivo se reporta à “indicação política” e não “indicação administrativa”, o que se restringe aos cargos de ministro e secretário de Estado. Em se tratando de indicação política feita por detentores de mandatos eletivos, cria-se a necessidade de exaurimento da conduta caracterizadora do nepotismo, ou seja, não basta a indicação de parentes em franca oposição ao que consta da Súmula Vinculante nº 13, do STF, necessário se faz a indicação de uma “finalidade ilícita”.
Ao fixar taxativamente as condutas caracterizadoras da improbidade administrativa por violação de princípios, o dispositivo legal deixou de fora diversas condutas, observadas de forma reiterada na administração Pública, que ficarão desguarnecidas no âmbito da lei. Nesse sentido tem-se a prática de assédio moral no ambiente de trabalho, que não mais caracteriza prática de improbidade por violação de princípios. Por outro lado, o servidor público que solicita vantagem em troca de favor ou benefício, comete crime de corrupção passiva, estabelecido no art. 317, do Código Penal, porém, caso não ocorra o efetivo recebimento da vantagem, a conduta não caracteriza prática de ato de improbidade.
Por fim, cabe ressaltar a exigência do chamado “dolo específico” para configuração da improbidade por violação de princípios, constante do § 1º, do art. 11, já abordado.
3. DEBATENDO
- É possível a aplicação da Lei nº 14.230/2021, com relação à exigência de dolo específico para a caracterização do ato ímprobo, aos processos em curso?
- Sujeito respondia por improbidade administrativa com base no art. 11, I, porque fez promoção pessoal em publicidade institucional. Com a revogação do referido dispositivo legal pela Lei nº 14.230/2021houve abolitio neste caso?
- As alterações promovidas pela lei nº 14.230/2021, quanto à supressão da modalidade culposa de improbidade, aplicam-se aos atos de improbidade praticados na vigência da lei anterior sem condenação transitada em julgado?
- Qual o limite da retroatividade das alterações dos tipos de improbidade efetivadas pela Lei nº 14.230/2021?
- João foi condenado (sem trânsito em julgado), antes da Lei nº 14.320/2021, pela prática de ato de improbidade administrativa previsto no art. 10 da Lei nº 8.429/92 sob o argumento de que não se exige efetivo prejuízo ao erário. O prejuízo seria presumido. João interpôs recurso especial contra essa condenação. Antes que o STJ julgasse o recurso, entrou em vigor a Lei nº 14.230/2021, que alterou o art. 10 da Lei nº 8.429/92. Após alterações operadas pela Lei nº 14.230/2021, o caput do art. 10 da Lei de Improbidade passou a exigir que o ato de improbidade cause “efetiva e comprovadamente” prejuízo ao erário. Esse novo entendimento pode ser aplicado para o caso de João? A exigência do efetivo prejuízo prevista na nova redação do caput do art. 10 da LIA (com redação dada pela Lei nº 14.320/2021) se aplica aos processos ainda em curso?
- A conduta de frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente configura ato de improbidade que causa dano presumido ao erário (in re ipsa)?
- Para configuração da improbidade por enriquecimento ilícito é necessário que a obtenção da vantagem patrimonial indevida decorra da prática de ato ilícito?
4. APROFUNDANDO
BENVENHU, Ricardo. Improbidade Administrativa: o acordo de não persecução civil e a tutela dos direitos indisponíveis pelo ministério público. Belo Horizonte: D’Plácido, 2022.
BEZERRA FILHO, Aluízio. Processo de Improbidade Administrativa: anotado e comentado. São Paulo: JusPodivm, 2023.
CAMBI, Eduardo Augusto Salomão, GARCIA, Emerson, ZANETI JÚNIOR, Hermes (Org.). A Nova Lei de Improbidade Administrativa. Belo Horizonte: D’Plácido, 2022.
CONTI, José Maurício, MARRARA, Thiago, LOCKEN, Sabrina Nunes, CARVALHO, André Castro. Responsabilidade do Gestor na Administração Pública: improbidade e temas especiais. Belo Horizonte: Fórum, 2022.
DAL POZZO, Augusto Neves, OLIVEIRA, José Roberto Pimenta (Coords.). Lei de Improbidade Administrativa Reformada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2022.
DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Improbidade administrativa, processo coletivo e a Lei nº 14.230/2021: consensos e dissensos numa coautoria. Revista do Ministério Público do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Ministério Público do Rio de Janeiro. nº 89, jul/set 2023.
GAJARDONI, Fernando da Fonseca, CRUZ, Luana Pedrosa de Figueiredo, GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel, FAVRETO, Rogerio. Comentários à Nova Lei de Improbidade Administrativa: Lei 8.429/1992 com as alterações da Lei 14.230/2021. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2021.
GARCIA, Emerson, ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa. São Paulo: Saraiva, 8 ed. 2015.
HOLANDA JR. André Jackson de; TORRES, Ronny Charles Lopes de. Lei de Improbidade Administrativa comentada. Salvador: JusPodivm, 2023.
MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Probidade Administrativa. São Paulo: Saraiva, 2020
PAULINO, Galtiênio da Cruz, SCHOUCAIR, João Paulo Santos, CERQUEIRA, Marcelo Malheiros, BALLAN JÚNIOR, Octahydes. (Orgs.). Comentários à Lei de Improbidade Administrativa. Salvador: JusPodivm, 2022.
TOURINHO, Rita. O Acordo de Não Persecução Civil: negócio jurídico nos planos da existência, validade e eficácia. Salvador, JusPodivm, 2024.
VANIN, Fábio Scopel, ROBL FILHO, Ilton Norberto, ROCHA, Wesley. Improbidade Administrativa: Lei nº 14.230/2021. São Paulo: Almedina, 2023.